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O forte desejo de ter um carro
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Adailma Mendes é editora-chefe de Economia do O POVO. Já foi editora-executiva de Cidades e do estúdio de branded content e negócios, além de repórter de Economia

O forte desejo de ter um carro

Existe a clara sensação para parte dos consumidores de veículos que dentro do casulo de ferros e plásticos se está protegido do mundo e, também, acima dos que andam pelas calçadas ou em ônibus e vans
Aumento nas vendas de carros seminovos e usados é de mais de 15% no acumulado de janeiro a abril no Ceará (Foto: FABIO LIMA)
Foto: FABIO LIMA Aumento nas vendas de carros seminovos e usados é de mais de 15% no acumulado de janeiro a abril no Ceará

Curioso ver que mesmo em meio a todo o caos da pandemia, aperto daqui e dali nas contas para passar o mês, mudanças na forma de nos locomover pelas cidades e mais discussões em prol de uma melhor preservação do meio ambiente, ter um carro ainda é desejo de muitos.

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Mal baixou a poeira do terror da segunda onda da Covid-19, e as vendas de seminovos e usados dispararam no Ceará. Em abril, vendeu-se 144% a mais que em março deste ano. Poderíamos até dizer que faz todo sentido pois enfim tivemos lockdown de 5 de março a 11 de abril. Mas até nisso é de se admirar. Só a partir do dia 12 do mês passado o comércio voltou a abrir as portas. Foi praticamente meio mês para as compras se aqueceram nesse nível. E se olharmos para a compra de carros novos, é sempre um sucesso. De março para abril últimos, o número de emplacamentos no Estado subiu 286,54%.

Existem realmente bons motivos para se justificar o investimento em um quatro rodas - a família que cresceu, a execução de um determinado trabalho que necessite de transporte próprio, a necessidade de levar alguém com dificuldades de locomoção motora -, mas ainda vemos a aquisição apenas como tentativa de garantir um determinado status na sociedade. Existe a clara sensação para parte dos consumidores de veículos que dentro do casulo de ferros e plásticos se está protegido do mundo e, também, acima dos que andam pelas calçadas ou em ônibus e vans. Lembro logo do filme de 1950 com o personagem Pateta. Muitos senhores Walker virando senhores Wheeler até hoje.


Nada mais jeca quando o caminho é por ter carro novo, seminovo ou usado só para aparentar o que não é. E lembro de dois episódios não distantes que aconteceram comigo para exemplificar essa relação desmedida de alguns com os veículos.

Costumeiramente levava meus filhos à escola caminhando. Com o colégio distante apenas três quarteirões, o melhor era esticar mesmo um pouco as pernas na curta caminhada e ainda olhar como estava a vizinhança e trocar ideias livres com as crianças sem estar ao volante. Mas por conta desse movimento normal e que deveria ser o comum, ouvi por diversas vezes dos vizinhos as perguntas: “Por que vão a pé”? Quer carona? Acredito que parte deles nem pararam para pensar na dependência que criaram de estar em um carro.

Outra história, esta estapafúrdia, foi a de uma ex-vizinha que me disse, até de forma vangloriosa, que esperava um presente do marido. O presente era um desses carros grandes de marca estrangeira, que Fortaleza está cheia. Quando perguntei se ela gostava de carros, me respondeu que nem dirigia. Definitivamente ela queria só um bibelô caro na garagem para exibir aos demais e desfilar nos fins de semana.

Que as vendas cresçam e os mercados sigam de pé, assim como o dos veículos, apoio e torço. Só não faz sentido, com ciclofaixas sendo feitas, emissão de carbono precisando ser zerada urgentemente, ainda se pensar em comprar um carro só para encher a boca e dizer que tem um.

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