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Moro pode falar de motim?
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O jornalista Carlos Mazza já foi repórter de Política, repórter investigativo, coordenou o núcleo de jornalismo de dados do O POVO e atualmente é colunista de Política

Carlos Mazza política

Moro pode falar de motim?

Tipo Análise

Pegando muita gente de surpresa, o ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro gravou na última semana vídeo onde defende atuação do candidato Capitão Wagner (Pros) durante motim de policiais militares ocorrido no início do ano no Ceará. Na gravação, Moro nega que o deputado tenha liderado o movimento de paralisação dos agentes, tese que vem sendo usada contra Wagner na campanha por seus adversários. Pelo contrário, diz que a participação do candidato nas negociações era voltada para "encerrar o movimento e atender a população de imediato". O mais difícil é entender qual a autoridade do ex-ministro para falar sobre o caso.

Não falo aqui sobre Wagner, da eleição em Fortaleza ou do embate travado entre PDT e Pros sobre o tema, mas diretamente da atuação de Moro durante a crise. Quando o ex-ministro veio ao Ceará em 24 de fevereiro, agentes já estavam amotinados fazia uma semana. Número de mortos durante os dias de paralisação já atingia a casa dos 150. Autoridades locais e nacionais tentavam debelar o movimento e garantir a volta da ordem às ruas. Parecia óbvia, portanto, a necessidade de uma postura rígida dos governantes em defesa da população e de fim do conflito. Apesar disso tudo, o ex-ministro preferiu ser dúbio e condescendente com amotinados.

Sem criticar o motim ou atestar a ilegalidade do movimento, disse só que agentes paralisados eram "profissionais dedicados". A fala foi recebida com festa por agentes que ocupavam quartel da PM em Fortaleza, sendo classificada por um dos líderes do movimento, o ex-deputado Cabo Sabino, como "cirúrgica". Acabou, portanto, dando combustível a mais aos que cruzavam os braços, que se sentiram contemplados. Fala divergiu radicalmente dos dois outros ministros do governo federal que estavam em Fortaleza, os bolsonaristas "puro sangue" Fernando Azevedo (Defesa) e André Mendonça (à época na Advocacia-Geral da União).

 Sergio Moro, ainda como ministro da Justiça e Segurança Pública, com Fernando Azevedo, Camilo Santana e André Mendonça, em Fortaleza, durante o motim
Foto: ministério da defesa / divulgação
Sergio Moro, ainda como ministro da Justiça e Segurança Pública, com Fernando Azevedo, Camilo Santana e André Mendonça, em Fortaleza, durante o motim

Sem dubiedade

"Venho conclamar para aquelas pessoas que estão envolvidas (em paralisações) adotem uma postura de retração nesse movimento. É importante, é a população do Ceará que sofre, e ela precisa confiar nas suas instituições, entre ela a Polícia", disse Mendonça, que hoje ocupa a cadeira de Moro no Ministério da Justiça. Nas redes sociais, ministros do Supremo e até um dos ministros mais próximos de Jair Bolsonaro, Jorge Oliveira (Secretaria-Geral da Presidência), já haviam condenado o movimento.

"Tenho muito orgulho de ser policial militar. Entendo, compreendo e concordo com muitas das reivindicações dos meus irmãos de farda. No entanto, não apoio a paralisação das atividades de policiamento ostensivo, pois é inconstitucional e prejudica nosso bem maior: nossa sociedade", disse Oliveira. Ou seja, não foi uma questão de zelo excessivo ou tentativa de evitar escalar mais o conflito. Moro decidiu deliberadamente por se omitir da questão. Em bom português, "lavou as mãos". Curioso que ele ressurja agora, às vésperas de uma eleição, para falar como autoridade no assunto.

Em baixa entre bolsonaristas e petistas, parece difícil que Moro convença muita gente de qualquer coisa.

"Contra o ódio"

Curiosa declaração do governador Camilo Santana (PT) nas redes sociais depois de debate realizado pela TV Cidade no último fim de semana. Compartilhando uma imagem dos candidatos no evento, destacou "respeito" a José Sarto (PDT), Luizianne Lins (PT), Renato Roseno (Psol), Heitor Férrer (SD), Anízio Melo (PCdoB) e Célio Studart (PV) como "candidatos contra o ódio e o desrespeito". Deixou de fora, portanto, Capitão Wagner (Pros), Heitor Freire (PSL) e Samuel Braga (Patriota).

Duas questões chamam a atenção. Primeiro, a inclusão de Luizianne Lins na citação elogiosa. Aliado informal de Sarto e do PDT na disputa, o governador vinha até agora evitando qualquer referência à candidata. Outra surpresa é a citação envolver Heitor Férrer, deputado que foi um dos maiores opositores do governo do Ceará durante a gestão de Cid Gomes (PDT), aliado de primeira hora de Camilo. Pelo visto, as coisas mudam.

 

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