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Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.

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Tipo Crônica
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Caras leitoras e leitores, escrevo a coluna de hoje para pedir desculpas por um erro que cometi há pouco mais de 15 dias em um reportagem sobre a ocorrência de estupros em Jericoacoara e Cruz. Como trabalho em um jornal transparente e me pauto pelo cuidado com a informação, estou à vontade para tratar do assunto.

O erro, como repete uma respeitada parceira de jornalismo, deve ser mestre e nunca chicote. Sim, mesmo assim, entrei numa penitência doída quando fui alertado que havia trocado o número de estupros de uma área de segurança composta por 19 municípios, no litoral Oeste do Ceará. Atribuí apenas a Jijoca de Jericoacoara e Cruz.

No mesmo dia do equívoco, em matéria assinada por mim no O POVO Online, a informação foi reposta. Na edição do dia seguinte, o impresso trouxe na capa e em matéria interna a precisão dos dados. Além da Ombudsman do jornal também ter escrito sobre o ocorrido. Não poderia ser diferente.

Nos primeiros seis meses de 2018, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará registrou 84 estupros na Área Integrada de Segurança 17 (AIS-17). Território onde estão esquadrinhadas a vila de Jeri, Cruz e mais 17 municípios. Este ano, em igual período, 76 mulheres foram brutalmente violentadas no mesmo mapa da AIS-17.

Só após o deslize na notícia, a Secretaria da Segurança do Ceará revelou que de janeiro a junho deste ano, sete mulheres foram estupradas em Jeri e uma em Cruz. Contra três casos, em igual período de 2018, na Vila e dois em Cruz.

Insisti com a Secretaria de Segurança na individualização dos dados nas 19 cidades da AIS-17. Em resposta, a SSPDS informou que "os recortes por municípios e por bairros são usados para efeito de investigação policial e investimentos em reforço. Ressaltamos, mais uma vez, que os dados de Cruz e de Jijoca de Jericoacoara foram passados em caráter de exceção, como explicado anteriormente".

De acordo com a Secretaria, "a metodologia empregada pela SSPDS, desde janeiro de 2014, prevê a divulgação de indicadores apenas por Área Integrada de Segurança (AIS) ou por territórios - Fortaleza, Região Metropolitana, Interior Norte, Interior Sul e Ceará".

Pois bem, a troca dos números para mim já virou lição. Mas é um ínfimo diante do problema trazido pela reportagem. Oito mulheres foram estupradas em uma vila turística. É grave. Fosse um só estupro, já era devastador.

O medo de ser estuprada entre Jericoacoara e Cruz, na rota Jeri-Preá, tem entre as causas a falta de um transporte coletivo para levar, por exemplo, trabalhadoras de volta pra casa após suas jornadas em restaurantes, pousadas e afins. Tanto que o aplicativo "carona segura" foi criado pelas mulheres de lá.

O inaceitável, que é a violação das vítimas por estupradores, não pode ser minimizado, supostamente, por causa de qualquer prejuízo turístico. Em Jeri ou em qualquer destino paradisíaco aqui ou qualquer canto da Terra.

O estupro é algo irreversível. Em minha família, dores silenciosas atravessaram gerações até eu me compadecer com uma de minhas avós. Mas o compadecimento não é tudo.

No caso de Jeri e Cruz, a falta de transparência e de ações por parte do poder público são avassaladoras.

Minha vó nunca falou sobre a dor dela, mas vi em minha mãe permanências.

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