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Soltar passarinho
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Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.

Soltar passarinho

Tipo Crônica
0812demitri (Foto: Carlus Campos)
Foto: Carlus Campos 0812demitri

O alento para mim, nesta semana, foi ter conversado por telefone com o advogado Hélio de Sousa Costa, de Coreaú. Um rapaz de 27 anos, fala mansa, simples nas respostas e sem a afetação costumeira de boa parte dos formados nos cursos de Direito pelo Brasil.

Não é crítica. Há jornalistas, médicos e outros "doutores" que sofrem da moléstia sanguínea da empabulação. Meu pai, por exemplo, é um desses advogados e conheço pencas. Reconheço, posso estar nessa lista para muitas pessoas e sigo me achando sem o vírus do "ser besta".

Sobre Hélio Costa, nem sei muito do caráter dele no dia a dia. Se é machista com a companheira de afetos e os dois filhos, se é afeito a jeitinhos para resolver questões nos tribunais, se dá carteiradas vermelhas, se se preocupa com o lixo que produz e a poluição do rio Acaraú e o mar...

Dele, mesmo, só conheço a atitude que deu no enxotamento justo do jornalista Sérgio Nascimento de Camargo da presidência da Fundação Palmares. Um ser vivo negro, racista e que ressuscitou a figura do "capitão do mato".

Foi para mim um sopro, um ato de soltar passarinhos engaiolados e se refestelar com o contra o absurdo de retrocessos desde que o Palácio do Planalto se caiou de Casa Grande.

É meio, também, a história do Rei Nu. Os abestados do convívio testemunham o idiota a desfilar com os badalos balançado, mas fazem de conta que ele veste uma seda majestosa. Ninguém diz nada, apesar do mal-estar. Talvez por medo de perder a cabeça, bajulação, inércia... até que uma criança grita sem freios a farsa.

Virou regra os imbecis aplaudirem torturadores, apoiarem invasão de terras indígenas, promoverem o Dia do Fogo pelas redes sociais e fazerem de conta que fazendeiros e madereiros estão sendo investigados e vão pra cadeia.

O advogado Hélio Costa, ex-agricultor nos cafundós do Semiárido cearense, aluno da escola pública e pagador do Fies, fez o que o Ministério Público deveria ter feito. Se a Fundação Palmares nasceu para não deixar que esqueçamos o que é ser livre, como aceitar ter ali um feitor?

O pior é o ministro da Justiça, um ex-juiz, permanecer passivo. Pode não ter o poder de barrar a indicação de raposas para chefiar galinheiros, mas não é possível que se baste em ser um dos bajuladores do Rei Nu e que tenha deixado de enxergar o abusivo.

Poderia vir a Sobral, ter com o juiz federal Emanuel Guerra e saber dele por qual motivo decidiu pela suspensão da indicação de um racista para Palmares. Não é possível que a legislação, de uma hora pra outra, tenha virado comuna.

Pode aproveitar e dar um pulinho em Coreaú, ir conhecer o rapaz que deu uma lição também em Onxy Lorenzoni. A decisão pode até cair, mas está posto mais uma vez a necessidade de se opor contra o vexatório de um tempo tacanho e violento contra direitos fundamentais.

Caro Hélio Costa, espero que você apele caso a decisão liminar caia. Não para se promover ou atrair clientes (a qualquer custo) para sua vida de pouco mais de dois anos de advocacia. Ser advogado pode fazer a diferença contra o autoritarismo escancarado.

Soltar passarinhos também deveria estar no currículo dos cursos de Direito.

Foto do Demitri Túlio

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