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Editorial: Transposição: consulta popular direta
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Editorial: Transposição: consulta popular direta

Tipo Opinião

Depois da inauguração do trecho inicial do Eixo Norte da transposição do rio São Francisco, na última sexta-feira, os nordestinos se deparam com novo desafio: o projeto de privatização da água da transposição, previsto por decreto do presidente Jair Bolsonaro. Aquilo que era aguardado com tanta ansiedade e alegria - a chegada das águas - poderá ser tisnado por uma reviravolta questionável na natureza pública do projeto. Se isso ocorrer, condicionaria a vida de 12 milhões de beneficiários e as gerações sucessivas, já que deixariam de ter livre acesso a esse bem natural. E ficariam submetidos a tarifas de concessionários privados, que deverão incorporar nelas suas margens de lucro. Além, é claro, de decidirem a que prioridade atender: a social ou a privada? E aí surge a pergunta: essa decisão pode ser tomada sem prévia consulta direta à população? O espírito da Constituição de 1988 responde que não, ao prever a democracia participativa - segundo especialistas. É a esse debate que está sendo chamada a sociedade civil (universidades, organizações empresariais e de trabalhadores, além das lideranças políticas e comunitárias). Trata-se de uma decisão da qual o Nordeste e seu povo não podem ser alijados.

Chegar até aqui, nessa grande obra, exigiu vencer barreiras quase intransponíveis. Primeiro, a disputa do orçamento público com as regiões mais ricas e de maior poder político, sempre propensas a açambarcá-lo para si. Foi preciso uma nova configuração na correlação de forças nacionais, fora do esquadro tradicional, para que o Nordeste visse seu pleito, quase bicentenário, ser finalmente acolhido. A justeza da causa e a brecha aberta, então, no condomínio tradicional do poder permitiram o empuxo que transpôs todas as objeções. Democraticamente. Algumas, inclusive, respeitáveis, do ponto de vista ambiental e estratégico.

Contudo, a maior parte das forças que conscientemente defenderam o projeto fizeram-no fundadas em razões históricas e de justiça social, pretendendo pôr o interesse público acima dos segmentais, restritivos. Não faltava a busca simultânea do progresso econômico como base de sustentação para a transformação social, em demanda de uma sociedade menos desigual.

Esses pré-requisitos não podem agora correr o risco de ser anulados pela entrega de todo esse patrimônio - erguido com o suado dinheiro do contribuinte - ao interesse privado. A luta não foi para colocar uma nova canga no pescoço do povo, negando-lhe o acesso universal à água - um bem natural e público -, através de uma tarifa ditada pela perspectiva de margens de lucro de um concessionário privado. Às vezes até estrangeiro.

A utilização da água como mercadoria privada está na contramão da tendência mundial de considerá-la bem público e de acesso universal. Falta consultar diretamente a população se aceita o contrário. 

 

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