Parece improvável que Ciro Gomes (PDT) desista da candidatura presidencial. Menos pelo desempenho nas pesquisas de intenção de voto ou pelos apoios recebidos e mais por já ter ido longe demais e deixado poucas pontes para se compor com qualquer lado que seja. Porém, essa improbabilidade ficou ontem um pouco menor. Ciro fez discreto aceno de que aceita conversar com os partidos da chamada “terceira via”. Ele foi provocado a falar sobre isso e deixou a porta aberta num claro esforço de se mostrar alguém aberto ao diálogo. Se dará em alguma coisa é outra questão.

No começo do mês, quando União Brasil, MDB, PSDB e Cidadania decidiram que terão candidato único a presidente, a ser anunciado em 18 de maio, Ciro logo os definiu: "As viúvas do Bolsonaro". E demarcou: "Não tenho nada a ver com isso". O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) respondeu: "Ciro é uma viúva do próprio Ciro."

Ontem, porém, o discurso de Ciro foi diferente. “Eu tive um jantar 15 dias atrás com a direção do União Brasil, Luciano Bivar e ACM Neto. Eles perguntaram se eu admitia entrar numa dinâmica de conversa com essas outras pessoas. Eu disse a eles que a mim repugnava a ideia de sentar com um inimigo da República como Sergio Moro. Parece que essa questão está vencida, portanto a única restrição que eu fazia está superada aparentemente”.

Bem, a rigor, quando falou das “viúvas do Bolsonaro”, em 6 de abril, a candidatura de Moro já estava rifada no União Brasil. Nada impede que seja retomada, mas não é hoje provável.

Pela postura e as manifestações de Ciro, a impressão é de que, sim, ele topa conversar com todos esses partidos. Se for para eles apoiá-los. Ele até tem argumentos. É deles o que aparece na frente das pesquisas. Mas, as ideias que Ciro tem manifestado são bem diferentes do que propõe, por exemplo, o União Brasil. Legenda com cujo comando ele conversou, e que no Ceará é dirigido pelo deputado federal Capitão Wagner. Já pensou se sai uma aliança nacional entre os partidos de Wagner e de Ciro?

O Ceará nos movimentos

Os movimentos de Ciro pesam bastante para a aliança PT-PDT no Ceará. As críticas dele a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) respondem por uma proporção da dificuldade dos petistas locais em engoli-lo que chega perto da totalidade. Não houve falta de esforços de interlocutores para que ele fosse menos cáustico. Inclusive da parte do ex-governador Camilo Santana (PT), para quem as tensões convergiam. Um eventual acordo de Ciro com a terceira via ajudaria os entendimentos no Ceará.

Porém, como escrevi antes, Ciro e o PDT já foram longe demais. No dia 31 de março, quando Sergio Moro deixou o Podemos e praticamente abandonou a disputa presidencial, enquanto Doria ameaçou desistir e ficar no governo de São Paulo, mas terminou saindo, Ciro publicou em suas redes: “Muitos vão ceder, mas não serei eu.”

Em 2 de abril, quando estava configurado o cenário, Ciro escreveu em suas redes: “Não adianta querer sair e não sair, querer ficar e não ser querido. A política tem sua própria dinâmica, sua própria força, que independe das vontades individuais. Ela – e somente ela – indicará os verdadeiros sobreviventes.”

A lição pode vir a valer para o próprio Ciro.

Os médicos e o governo

Em agosto de 2019, na permanente cruzada ideológica, o governo Jair Bolsonaro lançou um programa chamado "Médicos Pelo Brasil", para substituir o Mais Médicos. Ontem, os primeiros médicos foram chamados. Quem dependesse de tais profissionais para sobreviver já está morto.