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O espaço vazio e a sobrevivência política
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Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).

O espaço vazio e a sobrevivência política

Dos 25 parlamentares que fazem a representação cearense no Congresso, esteve lá apenas o deputado federal Doutor Jaziel (PL). É necessário tirar do cálculo quem é oposição e não costuma prestigiar tais momentos, seja qual for o governo ou o presidente
Tipo Análise
Ilustração Carlus Campos (Foto: Carlus Campos)
Foto: Carlus Campos Ilustração Carlus Campos

Há um recado na baixa quantidade de políticos que aceitaram, quarta-feira, se deslocar até Russas, distante de Fortaleza 162 km, para ornamentar o palanque oficial em torno do presidente Jair Bolsonaro, que estava ali em comitiva para entregar uma obra importante e de uma temática que gera votos numa região como a nossa. Como anunciado insistentemente, afinal, haveria o lançamento do edital para licitação de continuação das obras do trecho III do Eixo Norte da Transposição do São Francisco (derivação do Ramal do Apodi até o rio Salgado), aquela sonhada realidade que garantirá acesso perene à água quando tudo concluído. Típica situação em que quem pode tirar proveito e quer estar bem com a população faria o esforço necessário para aparecer bem na foto, impondo-se, neste caso, uma indagação que deveria estar martelando a cabeça dos articuladores políticos do presidente e a dele próprio: por que a bancada federal cearense não compareceu?

Para ser exato, dos 25 parlamentares que fazem a representação cearense no Congresso, esteve lá apenas o deputado federal Doutor Jaziel (PL). É necessário tirar do cálculo quem é oposição e não costuma prestigiar tais momentos, seja qual for o governo ou o presidente, mas, mesmo assim, entre apoiadores e independentes ainda teríamos pelo menos mais 10 deputados ou senadores, também excluído o solitário presente já citado, que poderiam estar lá tirando um pouco de casquinha da força da obra ou da popularidade de Bolsonaro. E, repito a pergunta: por que não foram?

Vale ainda o destaque de que a situação se repetiu em outros estados por onde passou durante a semana a caranava presidencial na denominada Jornada das Águas, até com algumas situações aparentemente mais preocupantes para quem pensa com a cabeça no interesse atual do Palácio da Planalto. Na Paraíba, onde o grupo esteve no dia seguinte à passagem por Russas, a bancada federal simplesmente ignorou um evento no qual se entregou mais um trecho local da mesma obra de transposição, ninguém apareceu por lá entre deputados e senadores do estado. De volta ao plano cearense, uma das ausências que mais chamou atenção foi a do deputado federal Capitão Wagner, do Pros (e a caminho do União Brasil), que planeja disputar o governo do Ceará ano que vem abraçado ao projeto de reeleição de Bolsonaro. Claro que nessa condição acabou sendo o único que precisou justificar-se e o fez alegando questões de saúde, certamente reais, embora no íntimo lhe tenha parecido uma coincidência conveniente para o momento delicado.

Será um erro de qualquer avaliador, de dentro do governo, de fora dele, da política, da academia ou da comunicação, minimizar a força implícita da mensagem. O deputado federal está entre os detentores de mandato que mais contato direto precisam manter com seu eleitorado, que melhor conseguem medir no tempo real a temperatura do público e, considerado isso, o que está posto pelo volume de ausências, no Ceará e em outros estados, confirma que o presidente Bolsonaro enfrenta um momento complicado e que lhe exige uma ação de resposta. O que explica, certamente, a escolha desses eventos para o anúncio de medidas de fortalecimento de programas sociais, do aumento no valor mensal do Auxílio Brasil (ex-Bolsa Família), do aceno para os caminhoneiros como atenuante da alta desenfreada dos preços dos combustíveis e de um conjunto de outros movimentos que deixaram o mercado de mal com o governo. Essa é outra história, porém, que não parece caber numa discussão cujo foco seja a briga, desde já, pelo voto em 2022.

Feliz, mas desarmado

O deputado Delegado Cavalcante, talvez entusiasmado com as posições públicas de Jair Bolsonaro sobre o assunto, quis subir ao palanque em Russas quando da passagem dele pelo Ceará, na quarta-feira, com seu (dele, no caso) revólver devidamente acomodado na cintura. Foi barrado pela segurança, claro, ensaiou uma argumentação - do tipo "sou delegado, além de deputado etc" -, não convenceu e somente sentou-se em posição privilegiada à direita do líder que admira depois de acomodar sua arma num local seguro e deixá-la sob guarda da equipe presidencial. É assim que as coisas funcionam no mundo real.

 

O Exército escolheu o PSB

Fosse outro momento do Brasil talvez a informação não se justificasse dentro de uma coluna que trata de temas políticos, mas, devido ao estilo de ser do atual presidente da República ganha um contorno diferente a decisão tomada pelo Exército de escolher Recife como sede de sua nova Escola de Sargentos. Um estado, afinal, onde o governador é de oposição e do PSB, e que disputou, na reta final, com cidades do Paraná e do Rio Grande do Sul. Ou seja, houvesse condições de interferir, e Bolsonaro já demonstrou não ter pudor quando fazê-lo parece possível, a escolha nunca seria a anunciada. "Por critérios técnicos", garantiu o comandante, general cearense Paulo Sérgio Nogueira, na quinta-feira.

Cada gabinete com seu ódio

O youtuber baiano Carlito Neto, do canal "O Historiador", que tem 343 mil inscritos e o próprio dono define como de esquerda, puxou uma fila de denúncias na semana passada contra um milionário paranaense que seria admirador de Ciro Gomes e lhe teria proposto dinheiro para "falar bem do pedetista e atacar o petista Lula". Sua opção foi por não revelar o nome do personagem, mas haveria até uma espécie de minutagem para estabelecer quanto poderia ser pago a partir do conteúdo etc numa ação que contraria a queixa cirista frequente de que é vítima de uma versão do "gabinete do ódio" que há no PT.

O silêncio do inocente

O empresário seria, há algum tempo, um conhecido apoiador de canais ligados à esquerda, costumeiramente fazendo doações generosas em dinheiro e até equipamentos. Sempre apoiando-se apenas numa questão ideológica, como expressava o próprio em grupos de discussão dos quais passou a fazer parte. Assim foi até que Lula teve os direitos políticos recuperados e o comportamento teria sofrido uma mudança radical, inclusive com cobranças pela ajuda dada anteriormente, ao ponto de levar Carlito Neto a tornar o assunto público. Outros canais de esquerda relataram a mesma situação e, até agora, Ciro Gomes silenciou sobre o caso.

Governismo em ação

É forte a ofensiva governista local, aqui juntando PT e PDT cearenses, sobre dois dos principais aliados potenciais do Capitão Wagner no seu projeto eleitoral para 2022. Os prefeitos Vitor Valim (Pros), de Caucaia, e Glêdson Bezerra (Podemos), de Juazeiro do Norte, têm sido objeto de tratamento especial e os sinais que emitem de correspondência à atenção recebida do Palácio da Abolição a cada dia tornam-se mais eloquentes. A troca pública de afagos da sexta-feira entre Valim e o governador Camilo Santana deixa isso muito evidente.

O palanque está enchendo

O evento da sexta parece começar a encaminhar o desfecho de uma conversa que tem evoluído muito bem desde o dia em que o senador Cid Gomes (PDT) levou o prefeito de Caucaia até o governador, lá atrás, e os fez ter uma primeira conversa amistosa. Desde então, a convivência entre eles só melhora. No caso do juazeirense Glêdson Bezerra, basta lembrar que ele já anunciou que apoiará as candidaturas dos petistas Fernando Santana, à Assembleia Legislativa, e Camilo Santana, ao Senado. Mais tarde vai ver como caberá nesse palanque também o Capitão Wagner como postulante da oposição ao governo estadual.

 

 

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Foto do Guálter George

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