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A origem do vice-presidente não justifica sua insistência no erro
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Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).

A origem do vice-presidente não justifica sua insistência no erro

FORTALEZA, CE, BRASIL,  04-12-2019: Vice-presidente da República, General Hamilton Mourão, no Palácio da Abolição.  (Alex Gomes/O Povo) (Foto: ALEX GOMES/Especial para O POVO)
Foto: ALEX GOMES/Especial para O POVO FORTALEZA, CE, BRASIL, 04-12-2019: Vice-presidente da República, General Hamilton Mourão, no Palácio da Abolição. (Alex Gomes/O Povo)

No afã de defender, pela comprensão, os excessos de policiais militares, o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, que é general do Exército, reformado, durante sua passagem recente por Fortaleza insistiu no erro de pré-julgar pessoas apenas considerando endereço e CPF. Foi quando decidiu abordar o caso da menina Ágatha Félix, de 8 anos, morta por um disparo de fuzil durante incursão policial pelo Complexão do Alemão, no Rio de Janeiro, onde ela residia com a família. O que Mourão disse na época, e que repetiu na fala a empresários e convidados na Fiec, na quarta-feira, foi que "o camarada da favela não vai chegar e dizer que foi o bandido que atirou".

Era outro tom, em forma de indagação etc, mas, em resumo, é o que o vice-presidente disse lá atrás e reafirmou agora. Em qualquer dos momentos é uma argumentação bastante discutível, porque já parte de um pressuposto que coloca em dúvida a fala de um cidadão, ou uma cidadã, apenas considerando onde mora ou o local em que a ocorrência se deu. Um preconceito inaceitável, em especial quando parte de uma autoridade do tamanho da que é conferida à segunda pessoa mais importante do País, na perspectiva do exercício do poder a partir do Estado.

O que acontece na situação específica, que o próprio Hamilton Mourão levantou no seu discurso, é que se trata de um (mau) exemplo ainda menos utilizável agora do que o era antes. Depois da primeira manifestação, que já nascera com base no nada, a investigação sobre o caso Ágatha avançou, uma perícia atestou que o tiro realmente saiu de um fuzil, estreitando as possibilidades de autoria e, mais recentemente, o Ministério Público denunciou em juízo o policial militar Rodrigo José de Matos Soares como responsável pela morte. Dentre outras coisas, pela conclusão de que os dois homens numa moto que seriam alvo do tiro, que acabaria encontrando no meio do caminho uma inocente criança, a caminho da escola, estavam desarmados, portanto, o episódio trágico não tinha como ser resultado de um fogo cruzado.

Uma autoridade com o peso que tem hoje Hamilton Mourão, a despeito de sua origem nas forças militares, não pode oferecer sua voz, involuntariamente que seja, ao reforço de um discurso que não serve ao momento do País, na perspectiva de fazê-lo reencontrar o caminho da serenidade, algo que deveria ser desejo do próprio governo Bolsonaro. Em meio a uma profusão de fake news e a boatos que tentam ganhar força de notícia, o caminho institucional sempre parecerá um porto seguro para que a racionalidade prevaleça, o que não acontece nesse caso.

Apesar de todas as evidências de que houve excesso na ação de um agente público, das manifestações oficiais e fundamentadas de instituições como a Polícia Civil e o Ministério Público, o vice-presidente da República insiste em colocar em dúvida a versão de pessoas apenas considerando o meio em que vivem. É triste.

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