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O paraíso perdido
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Psicoterapeuta sistêmico com especialização em Psicologia Transpessoal e Psicoterapia Somática Integrada. Viveu na Índia onde se aprofundou em diversas abordagens terapêuticas e de meditação. Fez cursos e supervisão em Constelação Familiar com Bert e Sophie Hellinger e foi o introdutor da Constelação no Ceará; Ashara atende individualmente e ministra cursos de formação em Constelação em diversas cidades do Brasil. Veja mais: www.ashara.com.br

Guilherme Ashara comportamento

O paraíso perdido

Descobrir a vida é talvez a experiência mais fascinante do ser humano, especialmente para a criança. Porém a vida nos ‘obriga’ a perder esse fascínio, esse estado de maravilhamento com tudo.
Tipo Análise
A vida é uma dádiva que precisa ser cultivada  (Foto: Adam Neumann/Unsplash)
Foto: Adam Neumann/Unsplash A vida é uma dádiva que precisa ser cultivada

Sempre falo nas minhas lives no Instagram (@guilherme_ashara) sobre nossas traumas e feridas da infância. Acompanhando uma dessas minhas lives uma seguidora me perguntou: “E ao contrário, quem foi bem cuidada na infância e sente sempre falta disso?”

Vou escrever como se estivesse respondendo à essa seguidora. Mas cada assinante que ler esse artigo pode se sentir no lugar dessa seguidora, afinal muitos de nós ainda imagina esse paraíso perdido, expressando: ‘que tempo bom era a minha infância’ ou ’tempos dourados que não voltam mais’.

Vejo que podemos olhar para essa questão por diversos ângulos. Primeiramente se você sente falta da sua infância, podemos deduzir que você não está muito feliz com sua vida nesse momento. Também podemos nos perguntar se você escolheu ver somente o que de bom aconteceu na sua infância.

É verdade que sempre temos um lado feliz na nossa infância. Estar vivo e poder respirar já é uma dádiva e a criança sente essa dádiva profundamente. Ela vive maravilhada com tudo. Uma simples concha do mar é motivo de deleite. Abraçar quem ela ama a deixa em total êxtase e derretimento.

Descobrir a vida é talvez a experiência mais fascinante do ser humano, especialmente para a criança. Porém a vida nos ‘obriga’ a perder esse fascínio, esse estado de maravilhamento com tudo.

 

"Quando crianças, uma simples violência inesperada, a morte de um dos pais ou a separação dos mesmos pode levar essa criança a ter uma experiência tão traumática que pra ela a vida se transforma num inferno."

 

Nascemos no paraíso, mas somos obrigados a conhecer pouco tempo depois o purgatório; e logo em seguida nos deparamos com o inferno. Hoje mesmo vi uma matéria mostrando que a primeira viagem de trem que um Ucraniano de 5 anos fez foi para fugir da Ucrânia durante a guerra com a Rússia. A mãe dessa criança expressava o terror e a desumanidade dessa experiência para seu pequeno filho.

Porém, não precisamos viver em guerra para experimentar o inferno. Quando crianças, uma simples violência inesperada, a morte de um dos pais ou a separação dos mesmos pode levar essa criança a ter uma experiência tão traumática que pra ela a vida se transforma num inferno.

O próximo passo dessa criança será criar mecanismos inconscientes de proteção para sobreviver. Ela pode parar de sentir, se tornando mais e mais insensível e paralisada. Pode começar a ser agressiva ou autopunitiva, agredindo a si mesma. Ela pode se mostrar boazinha, submissa ou sorridente, para que os pais a olhem. Talvez ela se torne silenciosa e acanhada, escondendo seus sentimentos.

Um dos mecanismos de proteção mais utilizados pelas crianças é criar um mundo de sonhos e fantasias. Ela cria castelos, príncipes, guerreiros, salvadores como uma forma de se proteger das ameaças físicas ou psicoemocionais. Muitas vezes ela só precisa um cantinho na casa ou na varanda para criar esse ambiente imaginário de proteção.

Existem inúmeros mecanismos de proteção. O importante para essa criança é sobreviver e tentar sair do inferno emocional que ela vive. A partir dessas estratégias de proteção, a criança pode até ter bons momentos na infância e adolescência.

 

"Descobrir a vida é talvez a experiência mais fascinante do ser humano, especialmente para a criança. Porém a vida nos ‘obriga’ a perder esse fascínio, esse estado de maravilhamento com tudo."

 

Todas as dores, carências ou desconfortos que sentimos na fase adulta foram implantados na infância. Tentar esquecer, evitar, reprimir, excluir ou encobrir não fará com que essas sensações desapareçam. Elas continuam ‘minando’ a nossa vida. E essa mina vai explodir no momento em que for engatilhada.

Os gatinhos mais comuns são frustrações amorosas, perdas de parentes, falências, acidentes graves, guerras, pandemias. Normalmente nos enganamos achando que essas situações que acontecem na fase adulta são o que causa o trauma. Porém, a grande maioria das vezes essas situações simplesmente engatilham traumas e feridas da infância.

Quando conseguimos ver e sentir essa criança emocional dentro de nós, damos uma passo imenso para a sua cura. A cura emocional de uma criança acontece com o acolhimento dos pais e da sociedade. A cura da nossa criança emocional ferida, quando já somos adultos, precisa do nosso próprio acolhimento com amor e aceitação.

Namastê!

 

Foto do Guilherme Ashara

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