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30 anos sem Sobral
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Advogado, pós-graduado em Processo Penal e mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (Unifor). É professor do Centro Universitário Estácio/Ceará e da Universidade Sete de Setembro (Uni7). Fundador do escritório Hélio Leitão e Pragmácio Advogados

30 anos sem Sobral

Tipo Opinião

Há exatos 30 anos falecia, longevo, Heráclito Fontoura Sobral Pinto, advogado cuja história de lutas em defesa das liberdades públicas e da democracia no Brasil tem servido de fonte de inspiração para os pósteros, elevado mesmo à categoria de ícone e referência de combatividade e destemor no exercício da advocacia.

Como poucos, arrostou o arbítrio, enfrentou poderosos, fez dos deveres do advogado profissão de fé, honrando a célebre máxima de Rui Barbosa, para quem "não há causa indigna de defesa".

Católico, alinhado às correntes mais conservadoras do clero brasileiro e adversário figadal do ideário marxista, pôs de parte suas convicções religiosas para assumir a defesa dos militantes políticos Luís Carlos Prestes e Arthur Ewert, próceres do levante comunista levado a cabo no país naqueles anos 1935.

Teve a coragem pessoal e cívica de denunciar as sevícias a que ambos eram submetidos nas masmorras da Polícia Especial de Getúlio Vargas, no Rio de janeiro, à época capital da República. Em episódio que viria a se tornar antológico, deu-se que, como os juízes então fizessem ouvidos moucos às várias petições em que denunciava as torturas sofridas por seus constituintes, saca do bolso do colete um gesto que hoje diríamos midiático: invoca em seu prol as disposições do Decreto nº 24.645, que estabelecia medidas de proteção aos animais, baixado no ano anterior por Vargas.

Ao que parece os animais gozavam de proteção jurídica mais efetiva no período, afinal eram tempos do nefando Tribunal de Segurança Nacional, vésperas da decretação do Estado Novo, quando se instalaria no país o autoritarismo sem disfarce.

Sobral Pinto sempre revelou grandeza de espírito e desprendimento. Fez a defesa pública da posse do presidente Juscelino Kubitschek, legitimamente eleito no pleito de 1955, contribuindo assim para frustrar a tentativa de setores golpistas civis e militares de promover a ruptura da ordem democrática e obstar pela força a posse do eleito.

Chamado ao depois por Juscelino a ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal, declina do convite ante a possibilidade de que pudesse ser entendida uma eventual investidura na magistratura suprema como paga pela defesa da legalidade democrática que antes fizera, de que a posse de JK era mera decorrência.

Entusiasta ingênuo do golpe civil-empresarial-militar de 1964, cedo rompe com o novo regime. Denuncia o autoritarismo, os ataques à liberdade de expressão e de imprensa, os assas-sínios de opositores políticos e a tortura, tornada rotineira.

É preso. Luta pela redemocratização, tornando-se um dos baluartes do movimento "Diretas Já". Uma vida vivida com dignidade e desassombro. Um exemplo para as novas gerações de profissionais do direito.

Difícil sintetizar sua vida e luta no espaço exíguo dessas linhas. Recorro à poesia de João Nogueira, no samba "Vovô Sobral", quando canta que "Vovô Sobral / No alto dos seus 90 anos/Reclama por direitos humanos/Nas praças de cada capital." Ele era assim. A poesia sempre me socorre. Ao contrário da justiça, não tarda nem falha.

 

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