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Por que um serviço é tornado "público"?
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Hugo de Brito Machado Segundo é mestre e doutor em Direito. Membro do Instituto Cearense de Estudos Tributários (ICET) e do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Professor da Faculdade de Direito da UFC e do Centro Universitário Christus. Visiting Scholar da Wirtschaftsuniversität, Viena, Áustria.

Por que um serviço é tornado "público"?

Basicamente, porque são tidos como necessários ao atendimento de necessidades essenciais da população. Por isso, ou se entende que devem ser prestados gratuitamente pelo Estado, ou, quando se cobra por eles, considera-se que o valor deve ser o mais baixo possível
O ICMS incidente sobre a energia elétrica é um dos mais altos do sistema tributário (Foto: .)
Foto: . O ICMS incidente sobre a energia elétrica é um dos mais altos do sistema tributário

Já parou a leitora para pensar por que certos serviços são considerados “públicos”, sujeitando-se a um regramento diverso daquele aplicável às atividades econômicas em geral, pautadas pelas leis do mercado? Em tese, todos eles poderiam ser prestados por particulares, em regime de livre mercado e livre concorrência, sem qualquer interferência estatal, mas o Direito, a começar pela Constituição, não o permite. Por quê?

Basicamente, porque são tidos como necessários ao atendimento de necessidades essenciais da população. Por isso, ou se entende que devem ser prestados gratuitamente pelo Estado, ou, quando se cobra por eles, considera-se que o valor deve ser o mais baixo possível. O serviço deve ser prestado a todos, de modo ininterrupto e universal, e pelo menor preço. Por isso não pode ficar sujeito apenas às leis do mercado, ainda que este também possa explorá-lo.

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Caso se observe a maneira como os serviços públicos são regulados e tributados no Brasil, contudo, vê-se que essa ideia, básica e fundamental, foi esquecida. Ou mesmo invertida. A essencialidade de certos serviços, dos quais a população não pode abrir mão, é usada para que o Estado, direta ou indiretamente, exija por eles mais do que em uma economia de mercado, com ampla concorrência, seria o caso de cobrar. Como a atividade é essencial, e a população precisa dela, paga-se o preço que for.

Daí a inversão: criam-se custos artificiais que em uma economia de mercado não existiriam, que se refletem nas tarifas, assim tornadas mais caras. É o caso do “valor da outorga”, cobrado daqueles que pretendem prestar o serviço público em nome do Estado, em regime de concessão. O mesmo se dá com a tributação, mais alta sobre alguns serviços públicos do que sobre atividades puramente privadas. O ICMS incidente sobre a energia elétrica é um dos mais altos do sistema tributário, apesar de a Constituição estabelecer que, se os Estados optarem por fixar percentuais diferenciados para o imposto, a depender daquilo que é tributado, o critério a ser utilizado nessa diferenciação há de ser a essencialidade. Tudo isso termina tornando mais cara uma atividade que é submetida a um regramento mais específico e rigoroso justamente porque é essencial e assim deveria ser mais barata.

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Deve-se ter cuidado com tais pontos, quando se discute a privatização. Sem entrar no mérito da questão de saber se as atividades e os serviços públicos, quando prestados por empresas privadas, seriam mais eficientes e baratos que os oferecidos por estatais, deve-se atentar para o fato de que a privatização em si mesma, dependendo de como ocorra, e de como a atividade pública a ser concedida ao particular seja regulamentada, pode manter ou mesmo criar custos e encargos artificiais e desnecessários, os quais se refletirão nas tarifas. As consequências das falhas na atuação da máquina estatal continuarão sendo suportadas pela população, com mudança apenas nas pessoas que estarão tirando proveito dela.

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