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O tempo perdido com o que não importa
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Juliana Diniz é doutora em Direito pela USP e professora da Universidade Federal do Ceará. É editora do site bemdito.jor

O tempo perdido com o que não importa

Tipo Análise

Poucos pontos do sistema político são tão importantes para a saúde de uma democracia como o sistema eleitoral. É nesse complexo de normas jurídicas que estão regulados aspectos como limites da propaganda política, financiamento de campanhas, condições de elegibilidade e os critérios do sistema proporcional, utilizado para eleição de vereadores, deputados estaduais e federais.

Entender o sistema eleitoral é um desafio, trata-se de um labirinto normativo penoso, pensado para oferecer segurança, celeridade e simplicidade. É pela inteligência desse sistema que sabemos que uma democracia é sólida, que as eleições são limpas e que os eleitos chegam ao poder através do legítimo voto.

Realizar eleições periódicas confiáveis em um país como o Brasil não é tarefa para amadores. Além das dificuldades proporcionadas pela dimensão continental, o país carrega seus vícios, a ameaça da fraude e do golpe sempre espreitando na esquina. Por essa razão, o tema da reforma política e eleitoral não é novo.

Especialistas e sociedade civil têm se dedicado com afinco a pensar mudanças que possam atenuar uma crise de confiança generalizada da opinião pública com o trabalho do Legislativo e do Executivo.

Há um desencanto compartilhado, uma sensação de que mudam os nomes e as práticas permanecem, num ciclo vicioso de inoperância que articula corrupção, promiscuidade entre o público e o privado e o desperdício do dinheiro público. Mais do que um dever cívico, pensar o sistema eleitoral é uma questão de sobrevivência democrática.

O debate pede maturidade para que se preserve o que funciona, o que tem oferecido bons resultados, e calma para decidir as mudanças. Não tem sido fácil cultivar essas virtudes.

De um lado, temos um presidente da República cujo único trabalho nos últimos tempos é criar artificialmente um clima de incerteza em relação ao processo eleitoral. De outro, um presidente da Câmara dos Deputados comprometido em reduzir a transparência sobre as deliberações no Parlamento, levando decisões importantes sobre o sistema a serem tomadas a toque de caixa, sob pretexto de urgência.

A tentativa de aprovar o distritão foi frustrada durante a semana, mas revela muito sobre o modus operandi pouco republicano de Arthur Lira.

A postura de Lira só faz sentido quando coordenada com a irresponsabilidade de Jair Bolsonaro. Sem apresentar provas ou evidências consistentes, o presidente e seus aliados lançam para os brasileiros um dilema desnecessário, exigindo de instituições, políticos e sociedade um esforço absurdo: demonstrar que a votação via urna eletrônica foi um grande avanço tecnológico e operacional, que trouxe segurança, rapidez e racionalidade à tarefa hercúlea de administrar as eleições no Brasil. Explicar, em suma, que é estúpido mexer no ponto que funciona, no ponto em que somos exemplo mundial de eficiência.

É assim, pela inutilidade e o absurdo, que Jair Bolsonaro, Arthur Lira e todos aqueles que colaboram com esse desgoverno nos apequenam como sociedade. É assim que perdemos energia e tempo lutando contra imaginários moinhos de vento vistos por um homem que não tem nem a integridade nem a candura de um Quixote. n

 

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