Logo O POVO+
Nome de colégio vira "prova de fogo" para jornal
Comentar
Foto de Ombudsman
clique para exibir bio do colunista

É o(a) profissional cuja função é exclusivamente ouvir o leitor, ouvinte, internauta e o seguidor do Grupo de Comunicação O POVO, nas suas críticas, sugestões e comentários. Atualmente está no cargo o jornalista João Marcelo Sena, especialista em Política Internacional. Foi repórter de Esportes, de Cidades e editor de Capa do O POVO e de Política

Ombudsman ombudsman

Nome de colégio vira "prova de fogo" para jornal

Leitores cobram que nome de colégio onde houve ataque de estudante na última semana seja destacado. Cabe ao jornal aprimorar mecanismos de itransparência a respeito dos procedimentos adotados em determinadas coberturas
Tipo Opinião
Comentar
Vítimas de ataque em escola do bairro José de Alencar já obtiveram alta (Foto: Reprodução/Leitor 
)
Foto: Reprodução/Leitor Vítimas de ataque em escola do bairro José de Alencar já obtiveram alta

O triste caso no qual um estudante de 15 anos feriu com uma faca dois funcionários de uma escola particular de Fortaleza (um professor e uma coordenadora) e um outro aluno adolescente de mesma idade foi um dos que mais resultou em mensagens por Whatsapp e por e-mail do ombudsman neste ano. O fato aconteceu na última terça-feira, 2, na unidade Sul do Colégio Christus, no bairro José de Alencar.

A primeira matéria do O POVO sobre o caso foi publicada às 10h04min. Menos de uma hora depois, o primeiro questionamento: “Qual a justificativa para não divulgar o nome do Colégio Christus nesta matéria? O Diário do Nordeste divulgou!”, contestou um leitor por e-mail enviado às 10h57min.

No espaço de comentários da publicação no Instagram do O POVO, as reações ficaram divididas entre o assombro dos seguidores com o ato violento e as queixas por não constar o nome do Christus na legenda da postagem. “O POVO, dê a notícia correta: ‘Aluno esfaqueia professor, colega e coordenadora no colégio Christus Sul’. Se fosse uma escola pública, a manchete estaria bem diferente, o nome da escola, bairro estaria estampado em letras garrafais”, cobrou uma seguidora no Instagram do O POVO.

Uma atualização foi feita às 13h23min, quando o nome do Christus foi inserido na matéria após o colégio se posicionar oficialmente para a reportagem por meio de nota informando o estado de saúde das vítimas. Divulgou ainda que não daria detalhes adicionais para preservar as identidades dos envolvidos. A atualização foi acrescentada logo em seguida na postagem do O POVO no Instagram.

A discussão sobre a identificação de instituições públicas ou privadas ou mesmo indivíduos em casos relacionados a algum tipo de violência ou que resultem em tragédia não é recente. Em casos do tipo, costuma prevalecer a avaliação se o ator envolvido foi vítima ou responsável por um determinado fato.

Expor o nome diretamente no título de uma matéria, por exemplo, pode incutir nos leitores uma ideia de culpa. As avaliações em uma apuração devem ser feitas caso a caso, considerando os detalhes de cada situação e se cercando de cuidados para que o Jornalismo não caia na armadilha de exercer papel de juiz dos acontecimentos.

Editora-chefe de Cidades, Tânia Alves explica o que pesa na hora de tomar uma decisão como essa, no calor de uma cobertura tensa. Ela lembra de caso recente que ocorreu em Sobral, também em ambiente escolar, no qual dois adolescentes foram assassinados num caso de natureza distinta de violência.

“Colocar ou não o nome de uma instituição de ensino ao publicar matérias que envolvem violência sempre gera debate na Redação. O motivo dessas discussões internas não é se a escola é pública ou privada, mas sim se a ação atinge crianças ou adolescentes, se foi motivada por briga de território e se pode ou não identificar quem precisamos proteger. Como as decisões precisam ser tomadas rapidamente, em alguns casos optamos por não divulgar o local inicialmente, mas atualizamos a informação depois. Foi o que ocorreu no atentado a uma instituição em Sobral, em setembro passado, e, nesta semana, em Fortaleza”, explica.

Até certo ponto pode ser vista como natural a reação de leitores em cobrar que O POVO divulgue com destaque no título o nome da instituição de ensino privado numa situação como a dessa última semana. Como trata-se de um colégio que é um grande anunciante do jornal, casos assim acabam sendo vistas pelos leitores como “provas de fogo” à autonomia e à independência editorial do jornal.

Não creio que a omissão inicial tenha ocorrido por questões econômicas. Mas não divulgar o nome do colégio pode automaticamente ser interpretado por parte dos leitores como um “rabo preso” do O POVO com quem paga caro por publicidade. Mesmo que isso tenha ocorrido em um intervalo de tempo relativamente curto entre a publicação da matéria e sua atualização.

Cabe ao jornal, portanto, estabelecer e aprimorar mecanismos de informações a respeito dos procedimentos adotados em determinadas coberturas. Por mais que a Redação tenha claros para si os critérios, não são todos os leitores que os conhecem ou compreendem. Explicar, por exemplo, que a decisão mais prudente do ponto de vista jornalístico era de fato dar a oportunidade do colégio se manifestar antes de mencioná-lo nominalmente. Até como forma de pelo menos diminuir tais dúvidas. Pior que a crítica dos leitores é a desconfiança deles.

Nota da Redação indica um caminho

Nesta mesma cobertura do caso na última semana, uma iniciativa de transparência foi aplicada como forma de deixar os leitores informados sobre os procedimentos adotados pela Redação. A edição de quarta-feira do O POVO manchetou o ataque no Colégio Christus, puxando pelo debate sobre saúde mental dos estudantes.

A propósito, cabe um parêntese ao olhar dado pelo O POVO à questão. Foi acertada a decisão de não ficar restrito ao factual do ataque em si e ampliar a discussão sobre saúde mental e como este tem sido um problema crescente nos aspectos educacional e de segurança nas escolas.

Na reportagem em questão, foi dado um destaque a uma Nota da Redação que dizia: “O POVO opta por não publicar foto, vídeo, nome ou qualquer detalhe sobre autores e como ocorrem ataques em escolas. A decisão atende a recomendações de estudiosos em comunicação e violência. Entendemos que a divulgação dessas informações pode vir a estimular novos agressores, que usem a divulgação como forma de promoção de atos de violência”.

O texto segue informando que a medida é adotada desde 2023 e que pode reavaliar a conduta “se novos estudos indicarem rumos que tragam maior segurança à sociedade”. Em abril daquele ano, um ataque realizado por um adolescente de 14 anos na Escola Isaac de Alcântara, localizada na Zona Rural do município de Farias Brito, deixou duas meninas de nove anos feridas.

Tanto no caso do Interior há dois anos como no da Capital na semana que passou a Nota da Redação foi inserida, explicando os procedimentos. Esta boa iniciativa pode indicar um caminho para que o diálogo com os leitores seja ampliado de maneira que as decisões da Redação sejam mais bem assimiladas.

Foto do Ombudsman

Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?