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Recantos
Foto de Pedro Salgueiro
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Escreveu livros de literatura fantástica e de contos, como

Recantos

Tipo Crônica

Dedicada ao caminhante Zé de Borba

BABOSA

Saindo de Tamboril em direção às cabeceiras do Acaraú logo encontramos um lugarzinho aprazível chamado Babosa, de lá se tem a mais bela vista da Serra das Matas e dos imponentes serrotes do Feiticeiro e Bico da Arara, quase sem perceber paramos para respirar fundo e absolver a toda aquela paisagem, o canto das cigarras invadindo fundo os ouvidos, o cheiro da rama nova queimando as narinas, quando lembramos que o caminho ainda será longo.

CAMPO DO JUÁ

Nada mais triste (e fantasmagórico) do que um campo de futebol - onde você jogou na infância - vazio, principalmente se ele for localizado no meio do mato (cercado ao longe pela Serra das Matas e pelos serrotes do Feiticeiro e Bico da Arara), vigiado pelos quero-queros que tentam, com seus cantos ecoados, proteger seus ninhos... Um silêncio em que se escutam apenas nossas respiração e pegadas... Como se não fossem nossas, mas de todos os fantasmas que ali jogaram bola em meio a gritos de alegria em domingos que se perderam na poeira do tempo.

CEMITÉRIO PAGÃO

Andando um pouco além da Babosa, alguns bons quilômetros em direção ao Juá, encontramos antigas cruzinhas de madeiras bem gastas, algumas com traves dependuradas e cercada de oferendas, arames, fitas e santinhos, muitos montículos de pedras como se fossem antigas brincadeiras de meninos.

Há tempos ouvia falar nesse velho cemitério de crianças pagãs, que a igreja não permitia ser enterradas no cemitério de São Miguel, mantido secularmente pela paróquia de Tamboril.

Quando na infância passava a pé em direção ao Campo do Juá, entretido em baladeirar passarinhos e gritar danações aos anuns e seus baixos ninhos, sequer percebia as tristes cruzes na beira do caminho.

Em tempos de secas elas sobressaem, feito assombrações, crescidas, disformes, enfeitadas de molambos e arames farpados, que com suas tantas pedriscas tentam proteger aquelas pobres crianças perdidas da sanha dos cachorros e outros bichos de rapina.

Em tempos de chuva os dois cruzeiros e as muitas cruzinhas se diluem na paisagem, veem-se galhos de árvores próximas afagarem seus braços magros, um que outro casaca de couro fazerem dueto em seus costados, em feitio de serenata.

Ultimamente vários protestantes quebraram o pescoço dos santinhos de gesso que os raros parentes dos anjinhos pagãos teimam em escorar nas gastas cruzes banhadas de chuva e sol.

Então me despeço, quase em soluço, e (em silêncio, claro!) prometo voltar no próximo janeiro para terminar de rezar o terço pela salvação de todas aquelas pobres alminhas.

Foto do Pedro Salgueiro

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