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Temer revela conversas com generais antes do impeachment de Dilma
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Plínio Bortolotti integra do Conselho Editorial do O POVO e participa de sua equipe de editorialistas. Mantém esta coluna, é comentarista e debatedor na rádio O POVO/CBN. Também coordenada curso Novos Talentos, de treinamento em Jornalismo. Foi ombudsman do jornal por três mandatos (2005/2007). Pós-graduado (especialização) em Teoria da Comunicação e da Imagem pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

Temer revela conversas com generais antes do impeachment de Dilma

Escrito para provar que não teria participado de um golpe contra a presidente Dilma Rousseff, o livro “A escolha - Como um presidente conseguiu superar grave crise e apresentar uma agenda para o Brasil”, de Michel Temer, parece indicar justamente o contrário: uma movimentação nos bastidores, incluindo militares, para afastar a presidente.

Versão
Segundo notícia publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo (2/11/2020), Temer resolveu gravar entrevistas com o professor Denis Lerrer Rosenfield para contar a sua versão da história, ainda durante o desenrolar dos acontecimentos que afastaram Dilma Roussef e o levaram à Presidência da República.

Encontro com generais
Temer revela que, no período de 2015/2016 encontrou-se por diversas vezes com os generais Eduardo Villas Bôas (então comandante do Exército) e com Sérgio Etchegoyen (então chefe do Estado Maior das Forças Armadas), quando era vice-presidente. Antes do impeachment, portanto.

Desgaste do PT
O histórico desses encontros, afirmou Rosenfield ao jornal paulista, mostra o desgaste da relação do PT com os militares devido à instalação da Comissão Nacional da Verdade, do temor que Dilma tentasse mudar a Lei de Anistia e de outros temas constantes no Programa Nacional de Direitos Humanos-3, de 2009.

Cenários
Os militares ainda afligiam-se com a possibilidade de o PT mudar a forma de acesso ao generalato e a formação de militares nas academias. Queriam assim, segundo Rosenfield, ouvir o então vice para saber com quais “cenários” deveriam trabalhar. “Não foi só uma vez. Foram várias contatos”, disse o professor.

Para Temer eram apenas encontros institucionais entre o vice-presidente e os chefes militares. Para quem quiser comprar pelo valor de face, é uma boa justificativa. Porém, a sequência dos fatos leva a uma explicação bem diferente.

Sintonia com Jucá
Como escreveu o jornalista Rubens Valente, em artigo para o Uol (3/11/2020), “Revelações de Temer estão em sintonia com os áudios de Jucá”. (A referência é a uma conversa que o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, gravou com o então ministro do Planejamento, no qual Jucá propunha um “pacto” para acabar com a Lava Jato, com “Supremo, com tudo”, incluindo militares.) Valente conclui seu texto assim:

Os pedaços de informação que vieram à tona até agora a respeito do papel dos militares na crise política indicam, acima de tudo, que essa história - a história das circunstâncias e forças políticas que levaram ao impeachment de Dilma - está longe de ser inteiramente desenhada. Está ‘em progresso’, como se diz hoje em dia. Temer, com seu livro, dá um pequeno e tímido passo que confirma o caminho que Jucá já havia sinalizado em 2016, quando foi gravado sem saber.

Na Presidência, Temer manteve Villas Bôas no comando do Exército e levou Etchegoyen, como ministro, para novo Gabinete de Segurança

Villas Bôas
Em abril de 2018, às vésperas do julgamento de um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal, que poderia livrar Lula na prisão, o general Villas Bôas foi às redes sociais para fazer uma advertência velada STF, demonstrando que o temor ao PT continuava presente. Escreveu ele:

Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do país e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?

Seguiu-se outra postagem:

Asseguro à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais.

Conspirador
No seu relato, Temer tenta livrar-se da pecha de conspirador, mas acaba, involuntariamente, confessando que confabulava com generais que divergiam da política que vinha sendo implementada pelo governo de Dilma Rousseff. Junte-se a isso com o fato de que militares sempre tiveram reservas aos governos petistas, e mesmo ojeriza do PT, como acreditar que o impeachment da presidente Dilma foi devido a “pedaladas fiscais”?

História
Por fim, com o livro, Temer tentar controlar o julgamento que historiadores farão de seu governo. Ele diz não ter dúvida de que se a análise for feita “sem ideologia e oportunismo”, será reconhecido como um presidente “moderado, inovador e reformista”.

Foi golpe
Mas a melhor aposta é que uma pesquisa desapaixonado do período mostrará de forma cristalina que a presidente Dilma Rousseff sofreu um golpe. Não nos moldes tradicionais, com tanques na rua, mas com os inimigos da democracia forçando a porta dos limites constitucionais.

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