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O tombo do PIB e o velho discurso do "poderia ser pior"
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Editor-executivo de Economia, é especialista em Teorias da Comunicação e da Imagem pela Universidade Federal do Ceará e mestre em Psicologia pela Universidade de Fortaleza. É vencedor de vários prêmios de jornalismo, como o Petrobras, Anac e ABCR.

O tombo do PIB e o velho discurso do "poderia ser pior"

PIB do Brasil encolheu 9,7% no segundo trimestre deste ano, queda histórica desde 1996, segundo o IBGE. O ministro da Economia, Paulo Guedes, minimiza o problema e diz que a atividade econômica nacional está decolando
Tipo Opinião
"Isso é impacto do raio que caiu em abril. Isso é de impacto lá atrás. Estamos decolando em V", afirmou o ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre o tombo histórico do PIB nacional (Foto: Agência Brasil)
Foto: Agência Brasil "Isso é impacto do raio que caiu em abril. Isso é de impacto lá atrás. Estamos decolando em V", afirmou o ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre o tombo histórico do PIB nacional

Embora o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil tenha registrado queda de 9,7% no segundo trimestre de 2020, levando a economia nacional a sofrer tombo histórico e colocando o País novamente em recessão técnica, o Governo Federal tenta, como sempre, amenizar o problema. Algo que não é característico apenas da atual gestão. Afinal, é mais fácil terceirizar responsabilidades do que assumi-las e reconhecer que errou. No atual contexto, o culpado por todas as desgraças é o novo coronavírus.

Na manhã desta terça-feira, 1º, o ministro da Economia, Paulo Guedes, fez questão de justificar a crise pelo velho discurso do "poderia ser pior", mesmo sem usar tal expressão. Mas deixou claro, nas entrelinhas de sua fala, que apenas a Covid-19, e não Governo, é responsável pela recessão técnica, caracterizada por dois trimestres consecutivos de encolhimento do nível de atividade econômica.

No Palácio da Alvorada, Guedes teve coragem de dizer, de forma metafórica, que a economia brasileira está "decolando em V", explicando que, após uma queda rápida da atividade econômica, a tendência é de recuperação na mesma intensidade. "Isso é impacto do raio que caiu em abril. Isso é de impacto lá atrás. Estamos decolando em V", afirmou o ministro. Decolar, de fato, é o verbo menos apropriado para explicar o atual comportamento econômico do País.

É claro que grande parte do tombo do PIB referente ao período de abril a junho, na comparação com o trimestre anterior, é fruto da crise provocada pela pandemia do novo coronavírus, que praticamente paralisou a economia global. A recessão neste ano, no Brasil e no mundo, já é esperada. Mas, se voltarmos ao período pré-pandemia, vamos observar que a economia brasileira cresceu apenas 1,1% em 2019, menor avanço em três anos.

Portanto, nossa situação já não estava confortável em janeiro de 2020, ano que começou, por exemplo, com 11,9 milhões de trabalhadores desempregados. Hoje, pelos cálculos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), são 12,6 milhões de pessoas nessa situação.

Medidas ajudaram a reduzir impactos negativos

Por outro lado, não fossem ações do Governo, como a Medida Provisória (MP) 936 — que permitiu a suspensão de contratos de trabalho e redução de salários — e o auxílio emergencial de R$ 600 durante três meses — agora estendido para mais quatro parcelas de R$ 300 —, a situação "poderia ser pior"? Sim, poderia.

Inclusive, segundo levantamento da Austing Rating, a queda do PIB nacional no último trimestre aparece entre as menores, na 22ª posição na lista de 48 países, quando comparada às principais economias, a exemplo dos Estados Unidos (-9,10%) e Alemanha (-9,70%). Em países emergentes, como Chile, México e Índia, as quedas foram de -13,7%, -19% e -23,9%, respectivamente.

A difícil retomada do crescimento econômico

Mas o que o Governo poderia ter feito antes, quando o mundo nem sonhava com a pandemia do novo coronavírus, para melhorar a péssima situação fiscal do País? Além de incentivar investimentos públicos e privados e diminuir o desemprego de maneira mais rápida? A fórmula mágica a fim de que isso ocorra, para a atual gestão, continua sendo a agenda de reformas que o Brasil "precisa para retomar o crescimento econômico".

A questão é que já passamos por mudanças nas leis trabalhista e previdenciária. Agora, a aposta é nas reformas tributária e administrativa, que deverão ficar para 2021. Mas quando isso tudo vai surtir o efeito esperado na economia para que ela, de fato, decole? Dificilmente, será em curto prazo.

Apesar do retorno de grande parte das atividades econômicas no País, a pandemia não acabou. E o tombo histórico do PIB nacional, desde 1996, é real. Como recuperar as perdas deste ano e o prejuízo já acumulado de anos anteriores, como 2015 e 2016?

Aprender a conviver com a pandemia, buscando outras alternativas de crescimento até a descoberta da vacina contra a Covid-19, é fundamental para o Brasil. Ao invés de olhar apenas para o retrovisor e se valer do velho discurso do "poderia ser pior", o Governo precisa aprender a enxergar à frente e se perguntar todos os dias, incansavelmente, "o que pode ser feito para melhorar?".

 

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