Quando um relacionamento abusivo se transforma em vício
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Sou jornalista de formação. Tenho o privilégio de ter uma vida marcada pela leitura e pela escrita. Foi a única coisa que eu fiz na vida até o momento. Claro, além de criar meus três filhos. Trabalhei como repórter, editora de algumas áreas do O POVO, editei livros de literatura, fiz um mestrado em Literatura na Universidade Federal do Ceará (UFC). Sigo aprendendo sempre. É o que importa pra mim
Quando um relacionamento abusivo se transforma em vício
Idealizar um relacionamento e vê-lo ser desconstruído com grosserias e violência tem um impacto doloroso na vida de uma mulher
Foto: Criação por meio do ChatGPT
ParaTodosVerem: mulher sentada na beira de uma cama com o corpo curvado para frente, as mãos segurando a cabeça. Seu rosto não aparece. A cena é iluminada por uma luz suave vinda de uma janela, transmitindo sensação de tristeza e introspecção
Ler sobre relacionamentos abusivos não é algo confortável. Seja na literatura ou no jornalismo, trajetórias que envolvem sentimentos amorosos, mas também tortura psicológica, desrespeito e violência me deixam como se estivesse suspensa de mim. Ouvir uma narrativa de sofrimento de alguém próximo, com quem dividimos afeto, torna a experiência da escuta ainda mais exasperante, embora se saiba o mar de emoções contrastantes no qual as pessoas navegam num estado assim.
Há alguns dias encontrei uma amiga que terminara um relacionamento de oito anos. Diante dela, num café, vi materializada uma dor que não conseguiria descrever. Em quase uma década, o relacionamento ruiu aos poucos, primeiro com grosserias que chegavam de surpresa. Depois, com desrespeitos públicos que se tornaram tão rotineiros que ela já evitava os amigos próximos e ficava nervosa nos eventos familiares. Um dia, na praia, ele jogou uma latinha de cerveja em sua direção chateado com alguma coisa banal. O susto, a vergonha e a vontade de sumir acenderam um alerta.
Depois, houve o episódio do murro na parede da sala após uma conversa tensa. A gota d'água aconteceu quando ele quebrou uma luminária no quarto durante uma briga. Ela descobrira uma traição, ele justificava afirmando que havia encontrado alguém que o entendia com seus “traumas de infância”. Sustentava que não havia nada demais nos encontros e que o “amor” que ele sentia pela minha amiga seguia igual.
Ela terminou o relacionamento, mas a saudade, às vezes, é tanta que se ele aparecesse na sua frente, ela voltaria, mesmo depois de tudo que já vivera. Os maus tratos sutis, um gesto perdido que deprecia, mas que não passava de “brincadeira”, até explodir em raiva e esmagá-la com palavras. Como dizer que minha amiga poderia estar a caminho de uma tragédia?
Deixei de lado toda identificação e fui clara em fazê-la perceber o real perigo de viver um caso crescente de violência que poderia acabar muito mal. Ter permanecido no relacionamento enquanto os maus tratos escalavam, talvez tenha sinalizado que ele poderia ir em frente e, por isso, não está aceitando a recusa dela. O abalo é real na vida de uma pessoa que vive relacionamentos abusivos. Aquela moça tão jovem, bonita, bem sucedida profissionalmente estava numa condição de tanta vulnerabilidade que a desconheci. Em anos nunca a ouvi falar nada sobre aquele homem por quem ela demonstra – ainda – ter tanto afeto.
O abandono na infância, as complicações entre os pais que ele, como filho mais velho, teve de enfrentar são sempre os motivos para agir de forma intempestiva. Sustenta-se numa violência crescente que sabe Deus aonde vai dar. Homens que rejeitam um tratamento, que acham bobagem buscar ajuda.
“Cheguei ao ponto de pensar que eu é que estava errada quando anunciei a separação. Ele me acusa de ter tido privilégios e, por isso, não querer mais aceitá-lo, mas o que eu estou é cansada de tanto desrespeito”. Olhei nos olhos daquela moça e poucas vezes tinha visto tanta desesperança e medo. O que eles chamam de amor, talvez sejam apenas pequenas doses diárias de tortura que viciaram os dois.
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