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O futuro da PM em jogo
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Ricardo Moura é jornalista, doutor em Sociologia e pesquisador do Laboratório da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC)

O futuro da PM em jogo

Tipo Opinião

Camilo Santana assumiu o Governo do Estado com um desafio: retomar a ascendência da Polícia Militar perdida durante a gestão de seu antecessor, Cid Gomes. Embora a corporação esteja vinculada formalmente ao governador, os humores da tropa nem sempre coincidem com a orientação de quem ocupa o cargo mais elevado do Estado. Por causa disso, o risco de alguma possível insubordinação, como a que estamos assistindo neste momento, nunca pode ser descartada por completo.

O que se segue são algumas sugestões que o governo, o poder judiciário, o ministério público e a sociedade deveriam levar em consideração visando reassegurar o controle sobre a tropa. É preciso começar a pensar o dia seguinte ao fim do motim, haja vista que a instabilidade é marca dos tempos atuais.

Despolitizar o debate sobre segurança pública. Desde a paralisação de 2011 não é mais possível debater segurança pública sem que um forte viés político-partidário atravesse todas suas dimensões. As condições de trabalho dos profissionais de segurança viraram moeda de troca política muitas vezes à revelia dos próprios policiais, que se sentem incomodados com essa prática. É importante deslocar o eixo dessa discussão para o fortalecimento da atividade policial em si.

Não dá mais para assistir a parlamentares e candidatos a cargos públicos tratarem uma questão tão séria de forma leviana nas redes sociais. Quando falamos sobre segurança pública estamos falando de vidas humanas, da defesa de direitos e dos fundamentos da convivência em sociedade. Discursos que tratem desses elementos de forma oportunista devem ser prontamente denunciados e desmascarados.

Palavra dita não volta atrás. As resoluções tomadas pelo Governo do Estado quando do período do motim devem ser cumpridas plenamente sem abrir margem para populismos. Numa tentativa de alinhar setores da corporação ao Palácio da Abolição alguns acenos e gestos de abertura foram realizados. A paralisação demonstrou que tais medidas, se não foram totalmente em vão, também não surtiram os efeitos esperados.

O momento atual pede rigor e recíproca. Também não há espaço para promessas. Os estados passam por um choque de austeridade que deve ser estendido a todas as categorias. Ser franco vale mais que criar uma expectativa irrealizável. Além disso, a médio prazo, não há sinais de que a economia venha a se recuperar ou de que os governos contarão com mais recursos.

Reestruturar a corporação. Os policiais têm uma queixa recorrente: a de que os concursos abriram vagas de uma forma desequilibrada quando se trata da composição da tropa. O efeito prático disso é um número reduzido de oficiais na comparação com o contingente de soldados e cabos. Por causa disso, viaturas estariam percorrendo as ruas somente com soldados sem a supervisão de um policial de maior patente, por exemplo. Em uma instituição que se fundamenta na hierarquia e na disciplina, parece haver um déficit de pessoas que comandem e estejam vigilantes justamente onde o poder estatal se apresenta com sua face mais visível à população.

Fortalecer a controladoria. Os órgãos de controle são os alvos preferenciais de uma retórica que defende, no seu extremo, a impunidade aos malfeitos cometidos na PM. Contudo, a Corregedoria é um instrumento imprescindível para que a atuação dos bons policiais não seja subjugada por aqueles que não se importam com o valor e o peso da responsabilidade de assumir o papel de agentes do estado.

A falta de um discurso mais duro contra os acusados pela Chacina do Curió e a vista grossa a transgressões que repercutiram nos mais diversos meios de comunicação, por exemplo, não são atitudes que passam impunes no interior da tropa. O preço a ser pago é o flerte com a possibilidade de impunidade em situações que desafiam o próprio governo.

Repensar a política de segurança. A coluna já bateu na tecla de uma avaliação do programa Ceará Pacífico, da realização de conferências regionais de segurança e da maior participação popular em uma área que lhe diz respeito profundamente. Há tempo ainda de construir esse canal de diálogo, de ouvir a sociedade civil e, principalmente, as pessoas que mais sofrem com a violência no Estado. A população emitiu um claro recado ao repudiar o motim deste ano, mas há demandas que ainda precisam ser atendidas. É preciso que isso seja levado em consideração quando da elaboração das políticas de segurança pública. A saída da crise passa pela ampliação dos espaços de controle social democrático e não por seu fechamento. Usando uma expressão bastante disseminada nos meios policiais "estamos todos juntos" nessa.

 

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