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Beira-mar
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Professor do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFC, é especialista nas áreas de História da Arquitetura e do Urbanismo, Teoria de Arquitetura e Urbanismo, Projeto de Arquitetura e Urbanismo e Patrimônio Cultural Edificado. Escreve para o Vida & Arte desde 2012.

Beira-mar

Tipo Crônica

A Gerardo Barbosa

Nunca fui muito de praia. "Água não tem cabelo, cabra!", dizia minha mãe quando eu menino me afoitava entre uma onda e outra desta parte do Atlântico que nos banha. O tempo que passei no mestrado e no doutorado em São Paulo me provou que não posso viver numa cidade sem bar, mas numa sem mar pode até ser. Mesmo não possuindo a verve e o talento de um Carlos Emílio Correia Lima, sou um observador do litoral. Apraz-me ver o rise and fall das praias de Fortaleza no gosto dos seus frequentadores. Posso dizer que vivemos hoje nesta Loura Bronzeada do Sol um refluxo do povo praiano, além deste agora ter uma visão mais generosa do nosso litoral. Os turistas, estes continuam os mesmos, fazendo de Fort City uma cidade balneário-dormitório...

Nosso caso de amor com o mar começou quando a cronista social Adília de Albuquerque resolveu mudar o nome da Praia do Peixe, com seu "fartum de vísceras de garoupa expostas", para Praia de Iracema, em meados da década de 1920. Antes local preferido pelos pescadores, jangadeiros e enfermos, virou o point dos bangalôs dos ricaços de então. Mais tarde, quando a Vila Morena se transformou em Estoril, os oficiais americanos e suas coca-colas fizeram animados saraus nas suas quentes areias. Aleardo Freitas e Rogaciano Leite, boêmios bambas, transformaram o bar em lar. Para Orson Welles e Antônio Girão Barroso, tudo era verdade no Mucuripe. Na década de 1950, o Edifício São Pedro e o Náutico Atlético Cearense contrastavam com o amplo coqueiral.

A avenida Getúlio Vargas, idealizada por Emílio Hinko, estendeu-se até o porto das jangadas no começo dos anos de 1960, início da derrocada do Centro. É quando surge a Beira-Mar do Cláudio Pereira, do Anísio, do Birivolks e do Pessoal do Ceará. Adolescente, banhei-me nas praias do Náutico, da AABB e do Ideal, tangas abundando à mancheia. A Praia do Futuro fez jus ao nome quando se deu a extensão da avenida Santos Dumont à orla leste, terminando na Praça 31 de Março, hoje felizmente denominada Dom Helder Câmara. Foi o tempo do império das barracas e dos caranguejos de Parnaíba, quando reinaram o Kabuletê, o Carnaubinha, o Playboy e a Tatarana. As barracas se agigantaram e viraram clubes. Nunca dei valor à Praia do Futuro, árido estirão.

Enquanto isso, as praias da zona oeste, coladas a bairros ocupados por gente humilde e segregada, também bombavam. Da Leste-Oeste à Barra do Ceará, esta uma das mais belas da Cidade, surfistas desviavam suas pranchas dos excrementos do interceptor oceânico. O polêmico projeto Vila do Mar mudou a cara desses locais para ficar tudo do mesmo jeito. Rainha, a Beira-Mar e seu calçadão são a sala de visitas, a academia de ginástica e o flirt place da urbe. A juventude dourada elegeu as praias dos Crushes e das Pontes como seu território, lá dando pinta nos três turnos do dia. Se a Praia de Iracema amarga a perda da boêmia sadia e da piscininha, antigos habitués seus vão a Iparana para bebericar e comer peixe frito. É isso aí, a vida vem em ondas como o mar.

Foto do Romeu Duarte

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