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Mar de Livros
Foto de Socorro Acioli
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Escritora e jornalista com doutorado em estudos da literatura pela Universidade Federal Fluminense. Ganhou o Prêmio Jabuti, na categoria de Literatura Infantil com o livro

Mar de Livros

Tipo Crônica

Nunca precisamos tanto de uma Bienal do Livro no Ceará. Perdemos muitas coisas esse ano e só os livros, os autores e as palavras podem devolver necessidades básicas subtraídas das nossas vidas nos últimos tempos. Uma delas é a esperança. Sem esperança não conseguimos acordar de manhã com a força que o dia exige. Não conseguimos sonhar, acreditar nas transformações e no poder de mudar.

Ainda precisamos voltar ao começo de tudo, à consciência de nação que não temos. Ainda não compreendemos que o Brasil é muito mais antigo que as datas dos livros, que os legítimos donos da terra eram os que estavam aqui antes dos portugueses - que também fazem parte de nós. Precisamos ouvir as vozes que nos contam sobre isso, nos livros e nas canções. Reconhecer o sangue dos povos ancestrais sob a pele contemporânea, conectada, acelerada, estressada e que precisa tanto de um balancinho de rede todos os dias, o vai e vem que nos lembra que o tempo é amplo, é longo e que somos apenas a ponta miúda de um fio antigo.

Falta muito ainda para compreendermos o desenho da nossa composição como gente brasileira, amar as cores e pessoas, alertar para as injustiças nos números assustadores que dividem negros e brancos. Teremos autores na Bienal para nos ensinar sobre isso. Precisamos de mais, é verdade, mas vamos aplaudir quem virá, ouvir o que temos a aprender. Louvemos José Eduardo Agualusa, Conceição Evaristo e quem mais chegar.

A Bienal do Livro é um direito nosso. É luta e conquista, é o resultado de esforço coletivo, um grito urgente de resistência. Se temos um presidente que chama torturador de herói, vamos ouvir Frei Betto para voltar a entender as feridas abertas e dolorosas da História do Brasil.

Vamos levar as crianças para que conheçam as narrativas africanas, indígenas, cearenses, brasileiras. É hora de aplaudir os novos autores, escritores que começam a contar suas histórias, criar mundos, fabular. É tempo de acreditar nas lições das narrativas, essa necessidade humana.

Há uma frase do Jules Renard que eu sempre repito e reescrevo: quando penso nos livros que tenho para ler, tenho a certeza de que serei feliz. E o que é a Bienal se não um mar de livros e esperanças? Autores, editores, livreiros, ilustradores, produtores culturais, jornalistas, contadores de histórias, todos os olhos voltados para uma só direção, por dez dias, preparando uma festa para os leitores.

São dez dias para repensar o mundo, encontrar novas maneiras de olhar a vida, alimentar a fé nos caminhos que se bifurcam, que se encontram, nas crenças de quem sabe andar na mata, nas histórias de quem sobreviveu e quer contar o que viu. Bienal vira floresta, vira mar, vira rio, vira África, vira Brasil. Bienal é Ceará, é Fortaleza. A festa dos livros é a Fortitudine de que tanto precisamos agora. Vamos buscá-la. É nossa.

 

Foto do Socorro Acioli

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