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Cearense de Juazeiro comanda a Lava Jato na PGR
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Cearense de Juazeiro comanda a Lava Jato na PGR

À frente de grupo na PGR, subprocurador Adonis Callou avalia que mensagens vazadas reforçam críticas à força-tarefa de Curitiba
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Adônis Callou (Foto: DIVULGAÇÃO)
Foto: DIVULGAÇÃO Adônis Callou

Escalado pelo novo titular da Procuradoria-Geral da República para assumir a coordenação do grupo de trabalho da Lava Jato na PGR, o subprocurador José Adonis Callou de Araújo Sá promete um "novo modelo de condução de investigações para implementação em todas as unidades do Ministério Público Federal (MPF)".

Em entrevista ao O POVO por email, Callou, cearense de Juazeiro do Norte, afirma que a principal mudança na gestão de Augusto Aras à frente da PGR é a delegação para o subprocurador "funcionar diretamente nos processos das turmas do Supremo Tribunal Federal (STF)". Caberá a ele, por exemplo, autorizar novas delações e fases da investigação, além de fazer sustentação oral no Supremo quando das sessões envolvendo casos da força-tarefa de Curitiba.

Na conversa, Callou admite ainda que as mensagens vazadas e publicadas por The Intercept Brasil e Folha de S. Paulo "serviram para reforço à crítica ao trabalho realizado em Curitiba". (Henrique Araújo)

O POVO - O senhor terá autonomia para autorizar delações e novas fases da Operação Lava Jato. Como deve conduzir os casos da força-tarefa?

Adonis Callou - Novos acordos de colaboração poderão ser realizados, desde que haja utilidade para os objetivos das investigações. Os acordos de colaboração apresentam utilidade e atendem ao interesse público quando levem aos resultados previstos na lei, dentre os quais a identificação de membros de organizações criminosas, de seus crimes e a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais. Em princípio, a mudança essencial na condução da força-tarefa da Lava Jato na Procuradoria-Geral da República (PGR) está na coordenação por subprocurador-geral com delegação para funcionar diretamente nos processos das turmas do Supremo Tribunal Federal (STF). Tentaremos elaborar um novo modelo de condução de investigações dessa dimensão, para implementação em todas as unidades do Ministério Público Federal (MPF).

OP - Como projeta o futuro da Lava Jato neste momento?

Adonis Callou - É importante observar que a investigação de crimes e o combate à corrupção são atividades permanentes do Ministério Público. Havendo delitos a serem apurados, haverá sempre o trabalho do Ministério Público e de outros órgãos do sistema de Justiça. Não importa o nome que se dê às investigações, o trabalho é permanente e será sempre aprimorado para maior eficiência no alcance dos resultados.

OP - Considera que a investigação ainda pode se estender a outros estados ou chegou a seu limite? No Ceará, por exemplo, a operação está praticamente parada.

Adonis Callou - A investigação deve estender-se para outros estados, na medida em que os casos forem desmembrados e distribuídos a outros juízos considerados competentes para o processo e o julgamento. O aprimoramento dos modelos de trabalho, como já mencionei, objetiva também facilitar a atuação de colegas de todas as unidades do MPF, com aproveitamento das boas práticas já testadas e utilizadas nas unidades que mais avançaram nas investigações.

OP - Acredita que as informações publicadas por "The Intercept" e Folha de S. Paulo causaram estragos à força-tarefa de Curitiba?

Adonis Callou - Não analiso o conteúdo das mensagens, mas é inegável que as publicações serviram para reforço à crítica ao trabalho realizado em Curitiba. Todavia, é importante não esquecer que se trata de obtenção criminosa de mensagens e por essa razão não produzem efeitos sobre os processos já julgados em diversas instâncias do Poder Judiciário. A euforia que se vê em torno das supostas mensagens é incompatível com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em torno da proteção da privacidade das comunicações, inclusive por meio dos novos aplicativos utilizados em telefones.

OP - Enxerga alguma ameaça à continuidade da Lava Jato hoje?

Adonis Callou - Como disse, a investigação de crimes e o combate à corrupção são atividades inerentes ao papel do Ministério Público, que é instituição permanente, de defesa da ordem jurídica e essencial à função jurisdicional. Escuto rumores de ameaças ao trabalho do Ministério Público desde que ingressei no MPF há 27 anos. Somos uma democracia jovem e ainda carente de consolidação de um sentimento verdadeiramente republicano. Precisamos ainda compreender com naturalidade a atuação das instituições, que existem para servir à sociedade.

OP - Como avalia a decisão do Supremo sobre alegações finais e que resultou na anulação de duas condenações na Lava Jato? Defende um limite para aplicação da medida?

Adonis Callou - Sigo a linha já defendida pela PGR, no sentido de que o prazo comum para que réus delatados e colaboradores apresentem alegações finais representa o cumprimento do atual regramento do Código de Processo Penal. Não deve haver nulidade de um ato processual praticado segundo a lei vigente. Além disso, o reconhecimento de nulidade exige demonstração de efetivo prejuízo ao exercício do direito de defesa e oportuna impugnação pela parte. Confirmando-se a nova interpretação do tema pelo STF, não pode ser aplicada automaticamente a todos os atos processuais anteriores praticados com observância da lei vigente e conforme a interpretação que então prevalecia.

OP - O Supremo também deve voltar a discutir prisão em segunda instância. Como se posiciona sobre esse tema?

Adonis Callou - Entendo correta a orientação atual do STF, que autoriza a execução da condenação confirmada em segunda instância. O sistema processual brasileiro permite, talvez sem paralelo no mundo, a discussão de temas em quatro instâncias do Judiciário, por meio de incontáveis recursos, prolongando por muito tempo o resultado final dos processos. Em cada instância do Poder Judiciário, é comum a utilização sequencial de recursos com o claro propósito de atrasar o fim do processo. Há muitos casos conhecidos de crimes graves, inclusive de homicídios, em que a execução das condenações somente ocorreu mais de vinte anos depois dos fatos. Em muitos casos, a prescrição tem decretado a morte da possibilidade de efetiva punição. Aguardar o exaurimento de todas as instâncias do Judiciário significa fomentar a ideia de impunidade que já prevalece no Brasil.

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