Duas adolescentes repetiam, na manhã de ontem, 20, as frases de um jogral, faladas pelo poeta marginal Jardson Remido. Elas reafirmavam, de forma cadenciada, narrativas de protesto. Nas frases, a escola pública ganhava um papel de destaque, com os alunos cada vez mais sendo aprovados no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). Tráfico de drogas e criminalidade davam lugar à oportunidade. Rainhas e reis pretos reivindicavam majestade e canudos em universidades. Os versos ecoavam pelo Centro Socioeducativo Aldaci Barbosa Mota.
A atividade fez parte da programação da XIII Bienal Internacional do Livro do Ceará, que acontece até domingo, 25, e ultrapassa os pavilhões do Centro de Eventos do Ceará (CEC). Este ano, as ações romperam os muros e chegaram até o Centro Socioeducativo. A unidade acolhe 51 adolescentes que cometeram atos infracionais, entre 15 e 17 anos. O evento inaugurou uma biblioteca que tem o diferencial de ter, preferencialmente, títulos com a temática juvenil, com acervo montado com a ajuda das próprias jovens. São cerca de três mil títulos volantes entre três bibliotecas, uma fixa, inaugurada ontem e duas móveis.
"Não adiantava ter livros e as jovens não se interessarem de ler. Temos um acerto de cerca de três mil livros nas três bibliotecas e a parte dos títulos foi de sugestão dos próprios adolescentes", diz a diretora da unidade, Elisa Barreto. Ela conta que a equipe percebeu que, trazendo livros do universo juvenil, as jovens se interessariam em ler.
E Elisa tem razão. Entre os títulos abertos à escolha das meninas, um deles foi o eleito por uma das jovens, de 17 anos. Ela acredita que o Cartas da prisão de Nelson Mandela, de Sahm Venter e Zamaswazi Dlamini-mandela, vai ajudá-la a enfrentar o período de reclusão. "Próximo ano, eu vou estar em casa e não quero mais voltar para cá. Enquanto não saio daqui de fato, saio pela leituras", ensina a jovem que planeja trabalhar na Perícia Forense. Ela gosta de ler de tudo, mas o livro preferido é o Garotas de Vidro. "É sobre uma menina que sofria de bulimia. Ajuda a gente a pensar sobre essas doenças que a gente pensa nem ser doença, mas mata muita gente".
Juliana Marinho, assessora da Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo (Seas) avalia que a arte e a cultura é a maneira mais promissora de levar reflexão para as jovens. "Muitas vezes a arte e a cultura propiciam momentos e sentimentos de positividade, de otimismo e propiciam que o adolescente trabalhe seus sentimentos, emoções, o trabalho em equipe. E tudo isso é importante quando se trata de evitar a reinserção nos atos infracionais".
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