Em entrevista com a psicóloga Sayonara de Freitas, a especialista destaca que, para falarmos sobre saúde mental da população negra, é necessário analisar todo um contexto interseccional e um recorte sobre as diversas camadas de violência que atravessam essa população.
Para ela, um dos olhares centrais é para o racismo estrutural, porque é justamente ele que, além de produzir muitas violências, mantém um projeto de negligência e distanciamento dessa população não só da saúde, mas também do lazer, da cultura e de outras possibilidades
"Precisamos ter brechas também para nos cuidar, para nos olhar. O racismo está nessa centralidade que muitas vezes nos impede de compreender a saúde e de nos entendermos como pessoas que precisam fazer essa manutenção diariamente. Ele muda nossa subjetividade enquanto pessoa negra, e é importante tomarmos consciência disso, porque são muitas marcas ao longo de muitos anos", explica.
A especialista abre espaço para falar sobre as diversas formas autodestrutivas que a população negra foi direcionada a reproduzir, como a violência e o vício em drogas, muitas vezes presentes no território.
"Tudo isso vem de não termos a possibilidade de nos olhar. É um projeto feito para que a gente não se olhe com cuidado, carinho e afeto, além de nos distanciar enquanto comunidade. É importantíssimo nos fortalecermos enquanto comunidade", destaca.
Sayonara lembra que, muitas vezes, não existe nem tempo para a tomada de consciência do que está sendo reproduzido, o que faz parte de um repertório emocional, cognitivo e comportamental dessa população.
"Hoje, quando se fala sobre autocuidado, o foco às vezes é só estética, mas é preciso compreender o que é isso para você, sem ficar só atento às grandes comparações com lugares de privilégio inacessíveis, nos quais o belo é só o branco. A autoestima negra, muitas vezes, é fragilizada ainda na infância", afirma.
Sobre a reconstrução da autoestima, a psicóloga aconselha o reconhecimento como uma pessoa negra e o entendimento individual das particularidades e singularidades, onde o encontro da beleza surge no autoconhecimento. Além disso, as relações com o outro estão totalmente ligadas ao cuidado em saúde mental.
"Quando estamos em grupo e começamos a ver a pluralidade das pessoas negras e a forma como elas se portam, isso também é importante para criarmos essas referências sobre beleza e autoestima. E, dentro da realidade, devemos olhar as possibilidades de minimamente ter um momento de lazer, de diversão e relaxar", conclui.