Tenho andado muito reflexiva nessa pandemia. Gerenciar nossos sentimentos, em meio à incerteza que estamos vivendo, tem sido uma tarefa árdua. Para todo mundo. Quando se tem duas adolescentes confinadas em casa, vivendo as angústias e ambiguidades típicas da idade, longe do convívio social e dos amigos, há seis meses, a intensidade dessa gestão emocional vai de zero a 100, muitas vezes ao dia.
Ando lembrando da adolescência da minha geração, que nasceu e cresceu nos anos da ditadura. A vida era simples, se comparada à complexidade que minhas meninas enfrentam hoje. Por outro lado, éramos pessoas mais inconscientes e desconectadas. Não havia internet, celular, redes sociais. Fake news eram boatos espalhados boca a boca, por telefone ou cartas.
Na efervescência dos anos 1980, estávamos começando nossa redemocratização, reaprendendo o que significava cidadania e liberdade de expressão. Ainda estudávamos OSPB (Organização Social e Política do Brasil) e Moral e Cívica. Ouvíamos a Blitz, Paralamas do Sucesso, Kid Abelha, Legião Urbana, Cazuza. Acreditávamos que éramos o país do futuro, com abundância de recursos naturais e um povo resiliente e trabalhador.
O movimento das Diretas Já encheu nossos corações de esperança. Tancredo morreu. De lá para cá, construímos uma nação disfuncional, desigual, preconceituosa, polarizada, violenta e corrupta, liderada por homens independentes, gananciosos, comprometidos apenas com sua própria ambição e agenda, protegendo os "seus" e querendo levar vantagem em tudo.
Hoje, quase três décadas da "cara-pintada" que fui, ainda insisto em acreditar no Brasil do meu sonho juvenil. Ele depende de nós. Da capacidade de enfrentarmos nossos preconceitos, mazelas e "desentortarmos". Somos parte de uma aldeia global, um imenso sistema vivo aberto, conectado em rede. Como nação, temos a responsabilidade de colaborar, consciente e coletivamente, para a sustentabilidade do planeta.
Essa pandemia tem nos mostrado que independência não é garantia de futuro. Daqui para frente, é "interdependência ou morte", como bem diz meu amigo Ricardo Guimarães.