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Sofia Lerche Vieira: Sob o signo das narrativas
Opinião

Sofia Lerche Vieira: Sob o signo das narrativas

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Sofia Lerche Vieira
Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Uece e consultora da FGV-RJ
 (Foto: Acervo pessoal)
Foto: Acervo pessoal Sofia Lerche Vieira Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Uece e consultora da FGV-RJ

Com a ciência aprendemos que existem os fatos e suas interpretações. Com a história, descobrimos que as fronteiras entre uns e outros são fluidas. Tal situação é particularmente verdadeira na modernidade líquida que caracteriza o mundo globalizado, segundo Zygmunt Bauman. Nele tudo é volátil e se consome sob o fogo das trocas virtuais. O império das versões tem nas redes sociais um terreno fértil à propagação de mentiras que ganham status de verdade.

Tal situação coincide com um contexto onde a informação da mídia tradicional vem sendo gradativamente substituída por versões veiculadas através de toda sorte de comunicadores - you tubers, influencers, usuários de aplicativos e outros cidadãos comuns. As redes sociais dão megafone a todos que desejem propagar suas verdades, sejam estas objetivas, ou não. Tal situação tem gerado mudanças sem precedentes nas formas de comunicação e em todos os setores da vida contemporânea.

Para bem compreender este fenômeno aprofundado pela internet, vale lembrar que as narrativas representam capítulo importante da capacidade de criar humana desde tempos imemoriais. Homero, a quem é atribuída a autoria dos clássicos Ilíada e Odisséia, segundo consta, era um poeta épico contador de histórias. As narrativas, quando bem contadas, têm o poder de seduzir os interlocutores. Lembremos que Sherazade sabia exatamente o que fazia ao contar e reinventar as belas "verdades" das Mil e Uma Noites.

As narrativas não estão objetivamente distribuídas entre a população; há aqueles que são mestres no dom dessa arte. Donald Trump, por exemplo, foi capaz de arrebanhar a turba ensandecida ao Capitólio, símbolo mundial da democracia. Deu no que deu... Abaixo da linha do Equador seguidores desta liderança incendiária ameaçam fazer movimentos semelhantes. As narrativas desses encantadores de multidões dividem o eleitorado; mais que isso, provocam fissuras em relações familiares e amizades. Os autores de narrativas absurdas sobre tudo e todos, entretanto, seguem sua marcha. Podem até encantar alguns, mas semeiam tempestade nos cenários por onde passam. 

 

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