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Luiz Carlos Diógenes: Rastos e restos de uma heroína
Opinião

Luiz Carlos Diógenes: Rastos e restos de uma heroína

O que mata a cidadania crítica de uma nação autônoma, com direitos e deveres cumulativamente interdependentes, é o olhar indiferente ao seu passado. Povo desmemoriado, sem saber de onde veio, dificilmente saberá para onde vai
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Mário Quintana, em versos emblemáticos de profundidade ecológica, para além de fios interconectados de energia psicossocial, lança uma luz de estrela polar, que pode guiar uma humanidade desorientada: "O que mata um jardim não é o abandono. O que mata um jardim é esse olhar de quem por ele passa indiferente... E assim é com a vida, você mata os sonhos que finge não ver."

O que mata a cidadania crítica de uma nação autônoma, com direitos e deveres cumulativamente interdependentes, é o olhar indiferente ao seu passado, relegado ao abandono. Um povo desmemoriado, sem saber de onde veio, dificilmente saberá para onde vai. Viver num presente sem raiz, florescência nenhuma de cidadania plena se lhe afigura. No recinto fechado da vida privada das famílias, ao menos duas vezes por ano costuma-se lembrar e render homenagens aos entes queridos: o dia do nascimento e o dia da morte.

A memória de Bárbara Pereira de Alencar parece restringir-se a estas duas datas. Quando é lembrada! No recinto aberto e público de uma nação, uma heroína deve ser o ente querido, imortal na memória popular, registrado nos livros e monumentos da Pátria, contada e cantada. Além dos restos mortais que sempre poderão ser descobertos e visitados por interesse público mundializado, também fica, pelas estradas pisadas, rastos da luta empreendida, lembrada, que pode ser aprendida.

Se a cultura do memoricídio ainda não teve força suficiente para destruir os restos mortais, feitos de ossos e símbolos, desta primeira republicana e presa política brasileira, muito pode apagar, pela ação do tempo, seus rastos ainda marcados no chão em que pisou. Inaugurar um ativismo político-cultural surpreendente, deixando atônita a sociedade machista e patriarcal do Cariri entre os séculos XVIII e XIX, deixa um rasto empedernido.

A pegada feminista do século XXI pode se atualizar por este paradigma exemplar, desfraldando, para o Mundo, a bandeira do feminismo complexo, de racionalidade interdisciplinar, ecológica, de ruptura com todas as opressões, ainda hoje, interconectadas. Que o Poder Público, em 2023, cuide desta heroína por um olhar diferente.

 

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Luiz Carlos Diógenes

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