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Interesses, negociações e caminhos
Opinião

Interesses, negociações e caminhos

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Nathana Garcez, doutoranda em Relações Internaiconais (Foto: Marcelo Freire)
Foto: Marcelo Freire Nathana Garcez, doutoranda em Relações Internaiconais

A Cúpula da ASEAN, tradicionalmente voltada a temas econômicos e de integração regional, tem se consolidado também como um espaço de diálogo geopolítico mais amplo - especialmente este ano, onde Estados Unidos e China buscam uma distensão em meio a tensões crescentes. Mas, nesta edição, uma imagem específica chamou a atenção do público brasileiro: a dos sorridentes presidentes Lula e Donald Trump, registrada em um encontro oficial que pode marcar o início de uma nova etapa nas relações entre Brasília e Washington.

O encontro ocorreu em moldes singulares, em campo neutro e com evidente cuidado diplomático de ambas as partes. Chamou atenção o tom de respeito mútuo - algo incomum na atual conjuntura americana e que remeteu ao encontro entre o líder estadunidense e o presidente russo, Vladimir Putin, realizado meses atrás. Além de Lula e Trump, também participaram peças-chave de ambos os governos, figuras que devem permanecer ativas nas negociações bilaterais que se iniciaram menos de 48 horas depois do encontro bilateral.

Do ponto de vista dos interesses, ambos os países têm a ganhar com uma aproximação. Para o Brasil, trata-se da oportunidade de reduzir as tarifas impostas meses atrás por Washington e recuperar um mercado relevante para seus produtos. Além disso, um entendimento mais estreito traria ganhos políticos em duas frentes: no plano externo, ao reforçar a imagem do país como ator capaz de negociar em termos de igualdade com os Estados Unidos; e, internamente, ao fortalecer a autoridade de Lula, podendo enfraquecer uma oposição conservadora de direita que ainda vê nos EUA um referencial simbólico de força.

Do lado americano, há também cálculos pragmáticos. A aproximação com o Brasil se alinha à busca de Trump por minimizar a inflação estadunidense, consolidando novas parcerias comerciais em meio à reconfiguração das cadeias produtivas globais e à crescente competição com a China pela influência na América Latina. Ademais, Trump parece nutrir uma admiração particular por líderes longevos, a quem costuma associar trajetórias vitoriosas e de resiliência política - traço que ajuda a explicar sua disposição em retomar o diálogo com Lula, apesar das diferenças ideológicas e das disputas comerciais ainda em aberto.

As conversas devem avançar sobre temas estratégicos para ambos os países: o tarifaço americano sobre produtos brasileiros, além de debates sobre terras raras e a possível instalação de datacenters de empresas dos Estados Unidos no país. São pautas que envolvem não apenas interesses econômicos, mas também projeções de poder e influência tecnológica em um contexto internacional competitivo. Agora resta acompanhar se a aproximação se transformará em avanços concretos ou ficará apenas como mais um registro simbólico na relação entre Brasil e Estados Unidos.

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