A forma de existência política, na vida humana, se revelou como portadora de um valor intrínseco superior à vida despótica e a ideia normativa central que levou a essa afirmação é a da dignidade do ser pessoal que funda direitos. Isso implica a rejeição da desigualdade fática fundada no privilégio ou na força como critérios de configuração da vida coletiva.
A existência política, enquanto tal, é, assim, a existência fundada nos direitos humanos e, por essa razão, tem a ver, fundamentalmente, com a efetivação de direitos. A democracia, enquanto uma forma de configuração da vida política, tem aqui seu pressuposto primeiro.
Na efetivação de direitos se deve sempre levar em consideração a hierarquia de valores de modo que se respeite o direito à vida como superior aos outros direitos no sentido de ser condição de possibilidade da efetivação de todos os outros valores. Assim, por exemplo, restrições à liberdade religiosa só são permitidas quando o exercício da religião fere direitos mais fundamentais. Limitações à liberdade de ação normalmente são consideradas restrições à liberdade enquanto tal, quando se considera liberdade o direito de fazer o que se quer.
O interesse moderno na maximização da esfera das decisões próprias conduz, frequentemente, à não consideração dos direitos dos mais fracos, como por exemplo, das gerações futuras e, antes de tudo, dos que passam fome.
O Estado se legitima como o poder do direito, isto é, como aquela instituição que emerge da necessidade de proteção ao direito, efetiva a positivação do direito e, assim, organiza também a si mesma na base do direito. A Vida é um bem do direito pré-positivo o que significa dizer que deve ser protegida, quando necessário, com o uso de meios coercitivos.
Mas, o Estado pode impor sua efetivação? Há, de fato, direitos à prestação no sentido estrito? Sem dúvida, pois aqui está em causa a dignidade do ser humano. No campo da moral existe uma assimetria entre ação e omissão. Matar alguém é um crime maior do que deixar alguém morrer de fome.
Além disso, deve-se levar em consideração o valor do bem em questão: já que a vida humana é um bem excelente com o qual a propriedade não pode concorrer em relevância, justifica-se o pagamento de impostos para ajudar pessoas que vivem na indigência. Daqui se segue um encargo social da propriedade.
Falar de liberdade do que passa fome é cínico. Só a superação da fome e a garantia de seu enfrentamento estrutural produzem liberdade e garantem direitos fundamentais. Isso é o princípio básico da configuração da vida coletiva. É insustentável a indiferença estatal frente às necessidades elementares. Então, é dever moral criar uma ordem política em que os direitos fundamentais das pessoas possam ser satisfeitos.
A fome é a negação básica da dignidade humana. Consequentemente, sua superação é a exigência primeira. Nesse contexto, é decisiva a consideração da hierarquia de valores. Assim, por exemplo, a defesa da propriedade, em sentido econômico, não pode estar no mesmo grau que a defesa da vida.