Há 40 anos, a saudosa Ângela Rorô lançava a música "Mônica", em alusão ao assassinato da jovem Mônica Granuzzo, que provocou comoção no país pela mistura de violência e banalidade presentes. De lá para cá, perdemos as contas de quantas Isabeles, Catarinas, Evelins, Allanes e Layses foram mortas por serem mulheres.
São tantos os casos que parecem notícias repetidas. A barbaridade do recente caso de Tainara Santos vem como uma espécie de gota d'água neste pote infindável de violências perpetradas contra as mulheres.
Ao ressaltar a importância da linguagem no entendimento da realidade que nos cerca e na constituição de nossa existência, o mestre Paulo Freire afirma que a leitura do mundo precede a leitura da palavra. Neste sentido, é preciso não só entender, mas dar nome às coisas: sim, estamos falando de violência de gênero. A combinação do machismo com o avanço da extrema direita e do conservadorismo religioso é um dos aspectos a ser destacado neste contexto.
O agenciamento de pautas morais que preconizam a subordinação feminina, alimentando a opressão e a limitação da autonomia das mulheres, aliado à naturalização do direito de controle sobre os corpos femininos tem gerado uma mistura bombástica e perigosa não só para nós, mulheres, mas para todos, já que famílias inteiras são arrasadas pelos impactos da violência - e esta parece ser uma das faces mais desafiadoras deste cenário, já a violência de gênero ocorre, em boa parte dos casos, dentro de casa.
Não por acaso, o aumento do número de casos de agressão, morte e, sobretudo, a banalização e a perversidade empregadas têm andado lado a lado com a reverberação de ideologias pautadas num discurso de ressentimento em relação às mulheres e à necessidade quase obsessiva de demonstrar a superioridade masculina.
Combativa em relação à ideologia de gênero supostamente apregoada por feministas e pela comunidade LGBTQIA+, ironicamente essa turba é incapaz de reconhecer a impregnação desta forma de "ideologia de gênero" em seus discursos e práticas.