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JULIANO CAZARRÉ: PAPEL DE JESUS E A RENOVAÇÃO DA FÉ

23/04/2019 00:04:22
EM NOVA JERUSALÉM, nove cenários grandiosos são palco para a encenação da Paixão de Cristo
EM NOVA JERUSALÉM, nove cenários grandiosos são palco para a encenação da Paixão de Cristo (Foto: Guga Matos/SeturPE)

Católico praticante, conhecedor da Bíblia e "conservador do bem", o ator Juliano Cazarré (38) encerrou ontem um dos capítulos mais importantes de sua carreira até agora: o desafio de viver Jesus na encenação da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém, a mais famosa do País, realizada no interior de Pernambuco. A temporada, que durou uma semana e levou uma média de dez mil pessoas por dia para o maior teatro a céu aberto do mundo, deixou muitas lições. No dia da estreia, após o espetáculo, o ator apareceu nitidamente comovido e grato, levantando as mãos para o céu, ovacionado pelo público.

Na entrevista a seguir, ele fala sobre a nova experiência, sua formação religiosa e sobre a importância do mundo se conectar com o Divino.

Como você se preparou para interpretar Jesus?

Juliano - Antes de vir pra Pernambuco eu pesquisei muito. Li a Paixão de Cristo pros meninos (os filhos Vicente, 8, e Inácio, 6, frutos do relacionamento com Letícia Cazarré). Fiquei me alimentando disso o tempo todo. E me aprofundei em algumas outras leituras menos ortodoxas também. Li um livro que aproxima os ensinamentos de Jesus de ensinamentos do ioga antigo, porque o ioga é uma prática que tem cinco mil anos na Índia, então eles acreditam que nos anos em que não se sabe da vida de Jesus ele pode ter andado lá, ter estudado com esses sábios, com os brâmanes. E um outro livro que faz a mesma coisa, mas mostrando a aproximação de várias parábolas que estão na Bíblia com textos sagrados do Budismo. E os textos são realmente muito parecidos. E eu fui colhendo esse material e sempre pensando com muito respeito na figura de Jesus, que é Deus vivo, verbo encarnado para os católicos, para os protestantes; que é figura central do espiritismo kardecista no Brasil; é também louvado na Umbanda... Então, eu me preparei bastante para vivê-lo com respeito para que todo mundo que acredita nele pudesse se sentir contemplado com a minha interpretação.

O que chamou mais atenção nessa apresentação em Nova Jerusalém?

Juliano Cazarré - A troca com o público, a energia é muito grande. E não é um público normal de teatro. É um público devoto, gente que já conhece começo, meio e fim dessa história, e que vem pra ver ela acontecer de novo. Tem gente que vem todos os anos. Então estou me sentindo muito honrado de estar aqui.

Você é uma pessoa espiritualizada, religiosa?

Juliano - Sou. Minha mãe é espírita kardecista, mas tinha uma avó muito católica, e só fui batizado mais velho, pra poder fazer a primeira comunhão, porque eu fui educado em colégio católico. Então minha mãe me deu uma educação espírita, mas ela fez questão de que eu estudasse em colégio católico, pra ter essa educação dos valores cristãos. Mas depois da primeira comunhão eu me afastei da Igreja Católica. Eu sinto que tem um certo cinismo contemporâneo em que você não pode falar mal de religião nenhuma, a não ser dos católicos e dos evangélicos. Todo mundo mete a lenha em católico e evangélico. Você pode falar que padre é isso, que crente é aquilo, sabe... Mas qualquer outra religião que você tente falar outra coisa, o mundo vai cair na sua cabeça! Não acho que você tenha que falar mal de religião nenhuma. Toda fé merece respeito. Mas eu acho que esse ambiente todo à minha volta, a universidade, você vai aprendendo.. aí te ensinam mal. Te dizem: Olha, Nietzsche disse que "Deus está morto!", só que na verdade Nietzsche não disse que Deus estava morto. Ele descreve um cara falando no meio da praça dizendo "Deus está morto e agora o que será de nós que matamos Deus, o que será de nós que não ouvimos o som do cadáver de Deus se desfazendo na terra, o que será de nós que não sentimos o cheiro da putrefação do cadáver do Deus que nós matamos?". Era Nietzsche avisando, em 1800, o século que viria, que é esse nosso século, sem espiritualidade, sem religião, sem divino, sem transcendente. Eu acho que eu passei por esse momento também. Nunca me defini ateu, mas teve alguns momentos em que eu pensei: "Será que o mundo não é só uma combinação de carbono e água e uma grande coincidência cósmica? E isso nunca me completou e nunca me fez feliz. E eu fui voltando pra minha fé, pro espiritismo kardecista, e senti vontade um dia de voltar pra igreja católica. Senti e voltei. Fui um dia assistir a missa, naquela mesma semana descobri o horário das confissões, pedi pra me confessar com um padre, contei meus piores pecados nesse tempo todo em que eu fiquei afastado, começando pelo de ter ficado muito tempo afastado, e me senti muito acolhido novamente pela Igreja. Ele me disse: Meu filho, você saiu da igreja, mas a Igreja nunca desistiu de você". E a partir daí eu comecei a poder participar da Eucaristia e estou muito
feliz assim.

Isso deu significado especial pra a sua interpretação de Jesus?

Juliano - Completamente. Não é um papel que eu estou fazendo como se fosse mais um personagem, sabe? O que eu peço todas as noites é: "Me ajuda a fazer isso de uma maneira que Te honre, de uma maneira que Te deixe feliz. Estou aqui para ser Teu instrumento".
Tô fazendo assim.

Você se refere muito ao que está escrito na Bíblia. Que relação você faz com a realidade que vivemos hoje, de intolerância, de não respeito às diferenças?

Juliano - Quando você lê a Bíblia você vê que a humanidade já sabe disso tudo há muito tempo. A corrupção tá lá denunciada, não só a corrupção do dinheiro, mas a corrupção moral já estava lá; a mentira; a inveja. A inveja está em Caim e Abel. A gente tem mesmo que estudar esses textos antigos porque é uma sabedoria milenar. Eu tenho me visto como um conservador, mas não é um conservador careta, é um conservador de coisas boas, entendeu? A gente tem que conservar Aristóteles, conservar Platão, Sócrates... A humanidade não começou ontem. A humanidade não começou em Woodstock. A humanidade é cada um botando um tijolinho, homens e mulheres, de mãos dadas. E eu acho que a Bíblia é um manancial de conhecimento que não precisa nem de religião pra ler a Bíblia. Amar ao próximo talvez essa seja a lição mais difícil. A gente não consegue amar nem mesmo um familiar nosso. A gente está sempre julgando. Mas eu acho que a gente está aqui no mundo pra dar cabeçada, vamos errar, é difícil, ninguém falou que era fácil, mas acho que a gente tem que tentar. A gente está nesse planeta, a gente tá nesse País, tem coisas práticas que a gente tem que resolver agora, mas a gente tem que trabalhar aqui na realidade com o olhar no transcendente, com um olhar no divino, viver a vida. Não é se trancar e ficar rezando num lugar, numa gruta. É viver aqui. Melhorar o ambiente da vida pra todo mundo. Contribuir com sua parte. Mas esse olhar no divino é uma das coisas que nos faz humanos.

TV, Teatro, Cinema... Qual a sua paixão?

Juliano - De Cristo!

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