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Por que a violência arrefeceu no Ceará
Reportagem

Por que a violência arrefeceu no Ceará

| NOVO CENÁRIO | Alterações no sistema penitenciário, esforços governamentais e dinâmica criminal são analisados por especialistas como algumas das causas de diminuição das mortes violentas
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A contínua redução do número de mortes violentas no Ceará é apontada pelo Governo do Estado como consequência de estratégias e investimentos, como a nomeação de novos servidores, as aquisições de equipamentos e novidades tecnológicas desenvolvidas junto a laboratórios de universidades.

Duas mil mortes a menos são comemoradas, com expectativa de 2019 encerrar-se como o ano menos violento da década. Todavia, na análise de especialistas, a redução dos Crimes Violentos Letais e Intencionais (CVLIs) também tem acontecido por outros fatores.

Ricardo Moura, pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC) e colunista do O POVO, avalia que as ações do Governo contribuem, mas ainda não têm eficácia mensurada. "Vínhamos de dois anos de muito confronto, com forte intensidade de ataques. Pode ter havido refluxo, recuo dessas ações hostis. A redução leva a um patamar anterior à escalada de violência no Ceará. Não é uma redução pontual, mas que afeta a base da estatística, equiparando há dez anos atrás. É um fenômeno novo", completa.

Ações da Justiça, efeitos da dinâmica criminal no País e causas externas podem ter impactado nos números de 2019. Entre os especialistas, é unanimidade, contudo, que os números de CVLIs baixaram porque estiveram no patamar mais elevado da história, em 2017. A tendência é de estabilização e queda, de acordo com César Barreira, professor da UFC e coordenador do LEV.

A maior redução desse tipo de crime está em Fortaleza (- 56,2%). César pontua que há violência menos difusa. "As duas ondas de ataques este ano provaram que há nova configuração do crime e suas práticas. Essas mudanças são resultado do crescimento e consolidação das facções, com posteriores alianças entre elas. Facções com características mais locais como a GDE cresceram e CV e PCC saíram mais de cena".

A quebra das hierarquias dessas organizações criminosas e troca de lideranças foram produto também dos rearranjos no sistema penitenciário. Para os estudiosos, a extensão dessas tantas alterações pode ainda se estender para o cenário futuro da violência no Ceará. Ricardo projeta estabilidade. "Dados históricos e comparações com outros estados mostram que é improvável queda mais intensa no próximo ano", aponta.

A redução de conflitos significa redução de custos para as facções. O distensionamento é sinal da estabilização e profissionalização do crime, após incontáveis mutações no modelo criminal atual, a partir da expansão do PCC, em 2005.

Bruno Paes Manso, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (USP), acrescenta que as mudanças nas estratégias e dinâmicas do crime são tendências nacionais, a exemplo da remodelação do varejo do tráfico de drogas e armas, além dos pactos entre facções. "As políticas de segurança pública são variáveis importantes, mas existe outro lado. O mercado do crime e as relações de poder nos territórios são determinantes. Tensões e alianças se repetiram como padrão em vários estados, entretanto não houve bola de neve, como se imaginava."

 

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