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Fortaleza tem mais 1,8 mil prédios antigos irregulares
Reportagem

Fortaleza tem mais 1,8 mil prédios antigos irregulares

Conforme levantamento da Prefeitura, recomendado pelo Ministério Público, a Cidade tem 1.831 edificações com mais de 40 anos e sem Certificado de Inspeção Predial (CIP)
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Local vazio onde desabou o Edifício Andrea em 15 outubro 2019 (Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Local vazio onde desabou o Edifício Andrea em 15 outubro 2019

Quando virou um amontoado de escombros cuja queda ceifou a vida de nove pessoas e deixou feridas outras sete, o Edifício Andréa, no bairro Dionísio Torres, somava 38 anos desde a construção e não possuía o Certificado de Inspeção Predial (CIP). O documento, exigido pela lei municipal 9.913/2012, em outubro de 2019, já deveria ter sido emitido e renovado pelo menos uma vez. Contudo, uma obra, iniciada sem escoras de sustentação e expondo vigas, terminou por colapsar a edificação que não passava por manutenção estrutural há tempos.

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Instada pelo Ministério Público do Ceará (MPCE), a Prefeitura de Fortaleza, realizou, após o desabamento, um levantamento de prédios com três pavimentos ou mais, residenciais e comerciais, com mais de 40 anos e constatou que 1.831 edificações da Cidade nesta situação não têm CIP. Dessas, 660 edificações são residenciais e 1.171 comerciais. Nenhuma delas passou por fiscalização municipal, foi autuada ou interditada.

Passado um ano da tragédia que suscitou o debate e movimentou órgão e entidades quanto a necessidade de exigência do CIP, a Agência de Fiscalização de Fortaleza (Agefis) apresentou cronograma e deve iniciar a fiscalização nos prédios com mais de 40 anos na segunda quinzena de novembro - com planos de realizar 100 fiscalizações por semana, dando prazo de 90 dias para regularização dos imóveis. Conforme a Agefis, os planos para início dessas vistorias municipais foram readequados "em decorrência da situação de emergência provocada pela pandemia da Covid-19".

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As edificações de 40 anos ou mais foram priorizadas neste levantamento, porque se "entende que sejam as que correm maior risco", de acordo com a promotora Socorro Brilhante, da 136ª Promotoria de Justiça do Meio Ambiente e Urbanismo do MPCE. Contudo, assim que concluir as fiscalizações, as demais edificações também passarão por por vistorias regulares de forma sistêmica. "Não vai ficar somente nessas. Eles (a Agefis) vão dar continuidade", garante a promotora que participou de uma comissão montada logo após o desastre.

O cronograma deverá, portanto, iniciar o que deveria estar sendo feito desde a regulamentação da a Lei de Inspeção Predial, assinada pelo prefeito Roberto Cláudio (PDT), em junho de 2015. De responsabilidade do poder público, a fiscalização, antes da tragédia do Edifício Andréa e mesmo agora, no entanto, não ocorre de forma regular.

O presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Ceará (Crea-CE), Emanuel Maia Mota, considera que a "Prefeitura realmente não fez nenhuma ação mais acintosa para ampliar essa fiscalização ou sequer fazer uma fiscalização efetiva". Diretor da Síndicos Profissionais (SindPro) há 12 anos e tendo sob seu escopo atualmente 20 prédios na Cidade, Paulo Feitosa corrobora para o apontamento do titular do Crea e garante que nunca nenhum dos edifícios que administra passou por qualquer ação fiscalizadora.

Feitosa considera que falta estrutura no poder público municipal para realizar esse monitoramento. "Não tem nem fiscais suficientes. Se a fiscalização fosse eficiente, seria uma aliada, seria muito bom para os síndicos e para todos, de forma geral. A fiscalização causaria uma pressão porque gera penalidades. Ela notifica, dá prazo pra ele resolver, caso não resolva, parte pras penalidades (multas que variam de R$ 1 mil até R$ 5 mil, e dobram em caso de reincidência). A fiscalização funcionaria como um educador para as pessoas aceitarem aquilo que é obrigatório e necessário. Sem a fiscalização, há um relaxamento até involuntário. Elas dizem 'não tá tendo fiscalização, não precisa fazer nada agora'", relata Feitosa.

Questionada se faz fiscalizações regulares desde a regulamentação da lei, quais os números de autuações por falta de CIP de 2016 até 2019, e quantos agentes estão voltados a essa fiscalização, a Prefeitura não respondeu. Por nota, a Agefis informou que faz fiscalizações a imóveis "com indícios de negligência às condições de higiene e segurança". A agência apontou que desde a vigência do novo Código da Cidade (Lei Complementar nº 270/2019), entre novembro de 2019 e setembro de 2020, realizou 261 fiscalizações a edificações, 114 autuações e quatro notificações. Já a Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma) indicou que entre 2016 e setembro de 2020, emitiu 1.110 CIPs.

Edificio ANdrea - Certificado de inspecao predial
Foto: luciana pimenta
Edificio ANdrea - Certificado de inspecao predial

 

Série

O POVO iniciou ontem a publicação de reportagens sobre a tragédia do Edifício Andréa e suas repercussões. A série prossegue até amanhã, quando se completa um ano do desabamento.

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