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A importância do Censo e os perigos de um País às escuras
Reportagem

A importância do Censo e os perigos de um País às escuras

Mesmo após um ano de atraso na realização do principal estudo estatístico do Brasil, ainda não há certezas do ponto de vista orçamentário e sanitário sobre sua realização
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Por que o Brasil não pode abrir mão do Censo (Foto: O POVO+)
Foto: O POVO+ Por que o Brasil não pode abrir mão do Censo

Se numa conversa informal um dos interlocutores perguntar o que é imprescindível ao desenvolvimento de um País, é provável que a resposta seja qualquer coisa que gire em torno de pleno emprego, razoável capacidade de consumo, programas de distribuição de renda, saneamento básico além de boas ofertas de saúde, educação e segurança públicas.

O hipotético diálogo poderia evoluir mais, até que algumas interrogações surgissem: com base em que informações são formuladas essas políticas públicas? Quantas pessoas existem neste ou naquele município? Como vivem social e financeiramente? Quem precisa do quê?

Reunir em único estudo as realidades dos moradores de Saboeiro, no Sertão dos Inhamuns, no Ceará, e de Blumenau, em Santa Catarina, é importante para uma compreensão de um País diverso e de proporções continentais. Principalmente no curso de um vírus letal que deixa sequelas sanitárias e econômicas.

O meio de acessar essas respostas é o Censo Demográfico, em situação de atraso. Incertezas pairam quanto à realização do novo levantamento sobre o Brasil. O estudo não foi feito em 2020 (como previsto para ocorrer a cada dez anos) em razão da pandemia de Covid-19. Neste ano, esbarrou em questões orçamentárias.

O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), levou a questão às barras do Supremo Tribunal Federal (STF). Decisão monocrática do ministro Marco Aurélio Mello, pela execução da operação, começou a ser julgada na última sexta-feira, 7, no plenário virtual de Corte. A decisão está prevista para sair até a próxima sexta, 14.

Antes de tudo chegar a esse ponto, a ex-presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Susana Cordeiro Guerra, percorreu os corredores da Esplanada dos Ministérios, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, em busca de garantir espaço para o levantamento aprofundado no orçamento federal. Ela pediu demissão em março.

Novo presidente do Instituto, Eduardo Rios Neto afirmou: "Estamos preparados tecnicamente para a realização do Censo neste ano. Há um clamor social para que ele ocorra." Sobre as finanças, disse que são necessários R$ 2 bilhões, seja por via judicial ou pelo Congresso, "para que todo o planejamento da operação censitária seja executado."

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Ex-presidente do IBGE (2017-2019), Roberto Olinto explica ao O POVO que o Censo vai ao domicílio de qualquer pessoa e, só nestes percursos, contribui para que o mapeamento geográfico brasileiro seja mais detalhado, por meio de uma tecnologia de geoprocessamento.

O Sistema Único de Saúde (SUS) necessita de planejamento, de modo que se saiba para onde irão médicos, enfermeiros ou equipamentos, lista o engenheiro de sistemas.

"Se você não sabe onde as pessoas têm casa própria e onde pagam aluguel, você não sabe onde faz política habitacional. Você precisa saber da renda para saber onde está a pobreza", acrescenta Olinto sobre outro aspecto relacionado à feitura do levantamento censitário.

Uma das autoras do livro "A quem importa saber?: A economia política da capacidade estatística na América Latina", reflexão sobre o nível técnico e institucional dos departamentos nacionais de estatística pela América Latina, Gabriela Lotta analisa que o Brasil já está "às escuras".

O estudo é feito de dez em dez anos. No intervalo entre cada período, projeções sobre as transformações da população são feitas. Se os prognósticos são realizados em cima de "informações envelhecidas", Lotta afirma que serão naturalmente imprecisos.

A importancia do censo segundo o censo

"E para piorar essa história", prossegue a pesquisadora, "no meio do caminho a gente teve essa bruta pandemia, que alterou radicalmente vários elementos."

Um deles é a dinâmica migratória das pessoas, diz Lotta. "Muitas pessoas foram morar no Interior agora durante a pandemia, ou teve empobrecimento, muitas pessoas foram para a favela, saíram das suas casas porque não estão conseguindo pagar aluguel." Ela afirma que as transformações geradas pela pandemia precisam ser captadas.

Segundo José Eustáquio, professor aposentado da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence), do IBGE, não se sabe sequer, atualmente, o tamanho real da população brasileira. Tanto pode ser de 213 milhões como de 220 milhões.

O Plano Nacional de Imunização (PNI) se baseia nestes números para o envio de vacinas. "Pessoal de Macapá, quando começou a campanha, prefeito não sabia a população de 80 anos. Me pediram e fiz a estimativa aproximada. É uma questão imediata. Para você resolver o problema da pandemia, você precisa saber a população", relata o Eustáquio, atualmente pesquisador independente.

A seguir, uma discussão sobre se o Censo Demográfico deve ser realizado em 2021 ou 2022.

 

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