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O que pode mudar com as novas regras eleitorais
Reportagem

O que pode mudar com as novas regras eleitorais

| 2022 | Enviado ao Senado na última semana, novo Código Eleitoral pode valer já para o próximo ano caso seja aprovado e sancionado por Jair Bolsonaro até 2 de outubro
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carlus campos (Foto: carlus campos)
Foto: carlus campos carlus campos

Após semanas de idas e vindas e mudanças de última hora, a Câmara dos Deputados aprovou, na última quinta-feira, 16, projeto que cria o novo Código Eleitoral brasileiro. Caso validada ainda em setembro pelo Senado e sancionada por Jair Bolsonaro (sem partido) até 2 de outubro, a norma pode trazer profundas alterações já para as eleições do ano que vem.

Na prática, o Código consolida, em um único texto, toda a legislação eleitoral do País, além de temas de resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Com mais de 900 artigos, o projeto é resultado de um longo trabalho de debates sobre lei eleitoral dentro do Congresso Nacional, que envolveu partidos políticos, movimentos sociais e especialistas na área.

Diversos pontos do projeto aprovado na Câmara, no entanto, ainda devem ser objeto de forte debate no Senado. O mais polêmico diz respeito à criação de uma "quarentena" de até quatro anos para algumas categorias poderem disputar eleições - incluindo juízes, membros do Ministério Público, guardas municipais e policiais.

Para a jurista Raquel Machado, especialista em Direito Eleitoral e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), a questão deve ser mantida pelo Senado e é relevante para o atual quadro eleitoral do País. "Sobretudo considerando que ela se aplicará a pessoas que, a princípio, não poderiam estar na política", diz, destacando que já existe a proibição, por exemplo, de atuação política de militares, que só podem disputar mandatos a partir de uma desincompatibilização dos cargos dentro de um prazo especial da Justiça.

Inicialmente apresentada com prazo de desligamento do cargo de cinco anos, a proposta de quarentena foi rejeitada em primeira votação na Câmara, atingindo apenas 254 dos 257 votos necessários. A matéria, no entanto, foi reapresentada com o prazo menor de quatro anos e acabou aprovada pelos deputados, por 273 votos a 211.

"Há diversos motivos para essa quarentena, até porque o militar não deve ter essa atuação politizada. E tudo o que aconteceu foi que, na experiência brasileira, nós vimos que a proximidade dessas pessoas com a política não é saudável", diz Raquel Machado.

O ponto atrai protestos principalmente da base do governo e de Jair Bolsonaro, que classifica a questão como uma violação de direitos individuais e promete vetar a medida caso ela seja aprovada no Senado. Especialista em Direito Eleitoral e vice-presidente da Comissão de Direito Administrativo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-CE), Igor Rodrigues minimiza as críticas ao dispositivo.

"O direito individual pode ser relativizado. Você tem exemplos simples até, como na liberdade de expressão, que não é ilimitada e pode sofrer restrições, se isso está aprovado em lei", diz. "O problema é fazer o que o Bolsonaro está promovendo, militarizando a polícia. Militares são respeitáveis, não tenho nada contra eles, mas a forma como isso tem se apresentado tem gerado problemas. Até porque o Direito acompanha a movimentação da sociedade. Se estão aprovando isso, algum motivo tem", avalia.

Outro dos pontos mais polêmicos é a possibilidade, prevista no Código aprovado pela Câmara, de revisão pelo Congresso de resoluções aprovadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Para alguns juristas, a medida possibilitaria uma interferência indevida de congressistas, principais interessados nas eleições, nas "regras do jogo" eleitoral.

A tese, no entanto, está longe de ser unânime entre especialistas da área. "Isso é relativo, sendo possível até pensar no modo contrário. Quando o TSE edita uma resolução, não é ele que está invadindo a atribuição do Congresso? Então porque ele, que é quem faz a lei, não poderia revisar isso em alguns casos?", questiona Rodrigues, lembrando ainda que, atualmente, são comuns casos de "mudanças surpresa" pela Corte, gerando confusão entre candidatos.

Outro ponto central foi a tentativa de recriação das coligações para disputas proporcionais, extintas em 2017 pelo Congresso. A proposta chegou a ser aprovada inicialmente pela Câmara, mas foi retirada do texto por conta de uma outra Proposta de Emenda à Constituição no mesmo sentido que tramita também no Senado.

"É claro que as coligações podem ter muitos efeitos negativos, como viabilizar a existência de partidos de aluguel, mas ela tem um lado positivo também, que é possibilitar a união de forças dentro de um cenário onde partidos grandes ditam a regra", diz Raquel Machado.

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