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Menor escolaridade, maior desemprego: 87% dos desempregados não possuem ensino superior no Brasil
Reportagem

Menor escolaridade, maior desemprego: 87% dos desempregados não possuem ensino superior no Brasil

| ESCOLARIDADE | Formados têm melhores salários e oportunidades de emprego; trabalhadores sem ensino superior enfrentam mais dificuldades no mercado de trabalho, mostra pesquisa
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Com a pandemia de Covid-19, o cenário econômico no Brasil fez com que trabalhadores perdessem sua forma de sustento ou encontrassem dificuldades para se recolocar no mercado de trabalho após sofrerem desligamentos. Aliado a problemas estruturais como a baixa escolaridade, o contexto de crise sanitária levou o País a bater recordes de desemprego, chegando a atingir quase 15 milhões de brasileiros no primeiro trimestre de 2021.

No Ceará, dados recentes do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) demonstram que o ano de 2022 começou com saldo negativo: o Estado teve 42.166 desligamentos frente a 40.658 admissões no mês de janeiro. Em Fortaleza, cidade que mais demitiu do que contratou no mesmo período, a perda de empregos foi puxada pelos setores de Comércio e Outros Serviços, categoria que contempla atividades como transporte, armazenagem e correio, serviços domésticos, alojamento e alimentação, por exemplo.

O pesquisador Alexsandre Lira, analista de Políticas Públicas do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece), explica que “normalmente em janeiro ocorre esse fenômeno, as empresas estão se acomodando, fechando balanço, parte dos contratados em novembro por conta do Natal estão sendo demitidos agora”.

“E 2022 não sinaliza como um ano bom: o aumento da taxa de juros, o processo de encarecimento do crédito e a inflação pressionando custos de combustível e energia podem fazer com que a economia esteja tendo um freio, e o número de desligamentos mostra que há uma adaptação a essa nova realidade”, pontua o economista.

Diante do avanço da cobertura vacinal e com a expectativa de retorno à normalidade, os setores econômicos vêm, aos poucos, reagindo — mas os números ainda são preocupantes. A busca por trabalho evidencia reflexos da desigualdade social, e os maiores afetados por essa realidade são os trabalhadores com baixos níveis de escolaridade. Em termos de empregabilidade, pesquisas apontam que profissionais formados no ensino superior têm conseguido melhores salários e mais oportunidades, mesmo em meio aos desafios impostos pela pandemia.

É o que mostram os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na última sexta-feira, 18: a taxa de desemprego no Brasil chegou a 11,2% no trimestre encerrado em janeiro (em relação ao trimestre anterior), e aproximadamente 84% desse contingente não possui formação acadêmica. Os mais impactados pela falta de trabalho, segundo as estatísticas, são os que possuem ensino médio completo (40,4%) — contra 9,7% que alcançaram o superior completo.

O peso da graduação

Um levantamento feito pelo Instituto Semesp, entidade que representa mantenedoras de ensino superior do Brasil, mostrou que para 82,2% dos egressos das universidades houve melhora para encontrar uma colocação após a conclusão de um curso de graduação. Entre as melhorias listadas pelos formados (por instituições privadas e públicas), foram citadas progressões salariais, o ingresso em uma pós-graduação e a conquista do primeiro emprego ou de um novo emprego dentro da área de formação.

Esses números corroboram os resultados mais amplos vistos na última Pnad Contínua, do IBGE. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do último trimestre revelou que a renda média real do trabalhador foi de R$ 2.489, o que representa uma queda de 9,7% em relação ao mesmo período do ano anterior. Enquanto isso, o estudo Semesp aponta que o aumento salarial de um profissional com ensino superior chega a alcançar um índice de mais de 180% em relação aos salários-base, e de até 255% para pós-graduados.

 

Oportunidades para quem se prepara

A supervisora do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE) no Ceará, Yvina Egídio, explica que, dentro dos programas de estágio para estudantes universitários, as empresas têm desenvolvido a cultura de contratar para investir no futuro profissional e em uma possível efetivação, por isso acabam sendo mais criteriosas.

"Daí a importância do estudante se preparar um pouco mais, buscar cursos, se envolver com a cultura da empresa, ser proativo, se mostrar interessado. A vacinação tem favorecido a retomada do mercado e as vagas estão surgindo com mais frequência, então, os estudantes têm de se preparar não só para entrar no mercado de trabalho, como também para se manter", afirma ela.

Segundo o professor Márcio Gondim, diretor Geral da faculdade Uninta Fortaleza, "as pessoas vêm percebendo a relevância da dedicação à graduação com excelência. Profissões como as da área da Saúde e Direito, que são continuamente solicitadas pela sociedade, demandam profissionais que possam apresentar respostas científicas adequadas às várias necessidades sociais."

"Com a valorização social de profissionais da saúde, que trabalharam na linha de frente da pandemia, desde a aplicação de testagem da Covid-19 até a plena recuperação dos pacientes, foi possível perceber um aumento expressivo na procura por cursos de graduação nessas áreas", pontua.

Já para a professora Rose Nunes, coordenadora da área de Estágio e Carreira do Centro Universitário 7 de Setembro (UNI7), "investir na educação superior e na formação continuada é uma das principais alternativas para se manter competitivo nesse cenário de crise e conseguir uma oportunidade no mundo do trabalho. O caminho é se desenvolver pessoal e profissionalmente por meio da educação."

É o que corrobora Áurea Frota, coordenadora-geral da Pós-Graduação (Lato Sensu) do Centro Universitário Christus (Unichristus).

Ela acredita que o estudante precisa ter uma formação sólida com desenvolvimento de habilidades para que tenha uma inserção.

"Não adianta mais somente uma formação inicial. A instituição de ensino é importantíssima para a inserção no mercado de trabalho, se ela conduzir o seu processo pedagógico de modo a desenvolver competências na graduação e na pós", assinala.

A professora aponta que houve um aumento na procura por especializações e o contexto de pandemia gerou uma demanda inesperada na pós-graduação da faculdade.

"Os cursos de terapia cognitivo-comportamental, fisioterapia e enfermagem em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), por exemplo, e outros que tiveram relacionado questões não apenas da pandemia, como direito penal, gerência de projetos, odontologia, estética avançada, odontologia, harmonização facial".

Na observação da coordenadora, "as pessoas estão cuidando mais da estética, outras da saúde mental, profissionais estão se preparando para cuidar de pessoas na UTI e outros para quando voltar tudo presencial".

 

 

FORTALEZA, CE, BRASIL, 18-03.2022: Leonardo Araujo. Ensino superior para driblar o desemprego, o personagem busca contantemente formaçōes no ensino superior como forma de driblar o desemprego. em epoca de COVID-19. (Foto:Aurelio Alves/ Jornal O POVO)
FORTALEZA, CE, BRASIL, 18-03.2022: Leonardo Araujo. Ensino superior para driblar o desemprego, o personagem busca contantemente formaçōes no ensino superior como forma de driblar o desemprego. em epoca de COVID-19. (Foto:Aurelio Alves/ Jornal O POVO)

Investir em conhecimento nunca é demais

A busca por um bom emprego e uma melhor remuneração fez o estudante Leonardo Araújo, 26 anos, perceber a necessidade de uma formação mais qualificada.

"Eu via muito meus colegas e familiares se formando e como era maravilhoso o mundo acadêmico. Todos que aparentavam ser bem realizados com seus objetivos tinham passado por esse percurso. Então eu sempre tive essa influência", conta o jovem, que chegou a estudar Administração, mas se encontrou no curso de Perícia e Investigação Criminal.

"Conhecimento nunca foi suficiente para essa área. Assim que eu me formei, fui procurar uma especialização tanto na área criminal como direito penal. Agora, estou finalizando MBA e já estou pensando em uma licenciatura ou doutorado. E existe uma competitividade muito grande, se você tiver experiência mas não tiver o conhecimento, a formação, que eu acredito que seja a graduação, você simplesmente fica perdido nesse mar de pessoas. Então uma especialização se torna mais necessária do que uma questão de orgulho mesmo", garante ele.

Leonardo acredita que ter um diploma foi um fator decisivo para conseguir oportunidades de trabalho.

"No início da pandemia, eu fiz algumas entrevistas e percebi que muitos tinham cinco, nove, até quinze anos de experiência, mas as empresas queriam quem estava cursando ou tinha uma graduação. Vejo muitos colegas experientes que precisam se submeter a cargos menores por não ter nível técnico nem superior, só o ensino médio", relata.

FORTALEZA, CE, BRASIL, 18-03.2022: Ana Elizabely. Ensino superior para driblar o desemprego, o personagem busca contantemente formaçōes no ensino superior como forma de driblar o desemprego. em epoca de COVID-19. (Foto:Aurelio Alves/ Jornal O POVO)
FORTALEZA, CE, BRASIL, 18-03.2022: Ana Elizabely. Ensino superior para driblar o desemprego, o personagem busca contantemente formaçōes no ensino superior como forma de driblar o desemprego. em epoca de COVID-19. (Foto:Aurelio Alves/ Jornal O POVO)

Conhecimento é essencial para a ação

Formada em licenciatura plena em Química, Ana Elizabely foi a primeira da família a concluir uma graduação. Ela não exerce a função de professora, mas não deixou de estudar.

A jovem de 26 anos optou por realizar outras formações no mesmo segmento para se especializar: "Iniciei no curso de tecnologia em processo químico, que seria a química da mesma forma, só que com habilitação para atuar em laboratório de empresa, ter CRQ, assinar projetos, etc; mas me encontrei na área da indústria e acabei iniciando Engenharia Mecatrônica, mais voltada para essa área".

Para Ana, todo conhecimento adquirido é válido. "Foi necessário você aprender a ligar pontos no jardim para hoje escrever. Quando você está atuando na área, o que conta é o que você sabe, é ser multi. Enquanto puder e tiver saúde para continuar me especializando, farei", afirma.

Salário

O estudo do Instituto Semesp aponta que o aumento salarial de um profissional com ensino superior chega a alcançar um índice de mais de 180% em relação aos salários-base

Desemprego

TOTAL

Taxa de desemprego no Brasil chegou a 11,2% no trimestre encerrado em janeiro

Formação

PARCELA

Aproximadamente 84% desse contingente não possui formação acadêmica

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