Logo O POVO+
Depois de 12 anos, Frejat lança "Ao redor do precipício", seu quarto disco solo
Vida & Arte

Depois de 12 anos, Frejat lança "Ao redor do precipício", seu quarto disco solo

12 anos depois do último disco de inéditas, Frejat lança "Ao redor do precipício", álbum que abre mão de rótulos e retrata sua maturidade como compositor e artista solo
Edição Impressa
Tipo Notícia Por
Roberto Frejat se apresenta na feira virtual 'Conecta+ Música e Mercado' (Foto: Leo Aversa/ Divulgação)
Foto: Leo Aversa/ Divulgação Roberto Frejat se apresenta na feira virtual 'Conecta+ Música e Mercado'

Um olhar na ficha técnica do novo disco de Roberto Frejat e é possível reconhecer que ele não quer caber em rótulos. "Ao redor do precipício" conta com nomes como Luiz Melodia, Jards Macalé, Alice Caymmi, Ritchie, Arthur Verocai, Carlos Malta, Pupillo, entre outros. Lançado 12 anos depois de "Intimidade entre Estranhos", esse quarto álbum de inéditas é o retrato do carioca de 58 anos que, embora revelado no meio de uma geração identificada com o rock, nunca quis se resumir aos clichês do gênero.

Frejat, assim como seu parceiro Cazuza, sabia como poucos o que tinha de rock na MPB e de MPB no rock. E, nesse cruzamento, construíram um repertório de clássicos. "Ao redor do precipício" ainda não tem seus clássicos, mas carrega o mesmo DNA. "A gente chegou a mostrar o disco em algumas gravadoras, mas o que teria de apelativo (comercialmente) para elas é muito distante do que eu quero fazer. De fato, em nenhum momento eu pensei em ter um hit. Tem a ver com maturidade, mas tem a ver com o desprendimento de caber em algum lugar", avalia Frejat, em entrevista por telefone.

Embora já tivesse desistido do formato físico, Frejat, que vinha lançando singles espaçados, ouviu amigos e decidiu reunir a nova produção em CD e streaming. "Os amigos perguntavam pelo novo CD e eu perguntava 'você vai comprar onde?'. Mas eu entendi que o disco funciona mais como um registro cronológico, pelo fato das pessoas saberem onde está sua cabeça naquele momento. Em cada álbum isso fica impregnado", explica.

A faixa-título é uma das três vinhetas instrumentais que dividem o disco, recurso inédito na obra do ex-Barão Vermelho. O que vem a seguir é uma série de referências e aprendizados de quase 40 anos de carreira. Como "Te Amei Ali", uma balada soul, com ares de Tim Maia e vocais feitos pelo mesmo quarteto que acompanha a cantora Iza - Érica Anjos, Leticia Pedroza, Murilo Santos e Junior Tavares. Já "Pergunta urgente" encosta em George Harrison, tanto nas intenções mântricas como na mensagem reflexiva ("Nada me convenceria a correr, só que eu bem precisava ser mais de um pro que eu quero viver"). A faixa é uma composição de Nenung, gaúcho, budista e membro da banda The Darma Lovers.

Nas 13 faixas de "Ao redor do precipício", é possível encontrar um pouco de tudo que fez Frejat ser um dos artistas mais populares do Brasil. "Tudo que eu consegui" é uma poesia de Antônio Cícero que Mauro Sta. Cecília transformou em letra de música e ganhou um arranjo dançante de disco music. "Amar um pouco mais" é uma das quatro parcerias com Leoni. "Isso é fruto de uma trilha sonora do filme 'Intimidade entre estranhos'. Ele (Leoni) já tinha feito a versão dele, o filme saiu e eu vi que algumas músicas estavam muito boas. Bicho, eu vou gravar essa porra toda", constatou o músico. Dessa parceria saiu também o ponto alto do disco, a faixa "Por mais que eu saiba", que combina o doce da letra, com a voz forte e o arranjo sinfônico assinado por Arthur Verocai. "É um xodozinho meu. É um momento que não chega a ser Frank Sinatra, mas tem essa abordagem de ser acompanhada por uma orquestra. É minha música 'Pet Sounds'", explica citando o clássico dos Beach Boys.

Outros dois elementos merecem destaque em "Ao Redor do Precipício". O primeiro é Alice Caymmi encarnando uma dominatrix em "A sua dor é minha". Frejat coloca voz em algumas frases e arranha sua guitarra, mas é ela quem toma conta de versos como "Você me toca porque eu quero, você só me beija porque eu deixo antes". A música já estava pronta e Frejat propôs convidar uma mulher pra colocar a voz. "Ela (Alice) demorou a responder e achei que não tinha gostado. Mas respondeu, veio, cantou brilhantemente e foi embora consagrada", brinca Frejat.

O outro elemento são as presenças de Luiz Melodia e Jards Macalé, parceiros de Frejat em "E você diz". A faixa foi composta em torno de 2015 e reafirma a admiração do roqueiro por esses dois velhos malditos, ainda mais falando sobre tema tão atual: "fakenews". A voz de Macalé dá ainda mais peso a esse baião roqueiro de arranjo climático. E Frejat completa a mensagem falando sobre o Brasil de hoje, entre críticas à política federal "absolutamente patética".

Essa indignação remete a 1985, quando o País aspirava um novo momento, com o fim da ditadura militar. No palco do Rock In Rio, Cazuza encerrava o show do Barão desejando "que o dia nasça lindo pra todo mundo amanhã, com um Brasil novo e uma rapaziada esperta". O show foi em 15 de janeiro, dia que Tancredo Neves foi escolhido o novo presidente da república. "É muito triste a gente chegar agora a esse estado das coisas. A gente tem um País com recursos muito fortes, capacidade de ser uma economia forte. Mas esqueceu da coisa mais importante que é a educação. O mundo está caminhando para um ponto em que a qualificação vai ser definidor entre você estar dentro ou fora da economia. E eu não quero dizer que a economia é mais importante, mas é o que faz o mundo girar. Não é uma questão de ver a economia em primeiro lugar, mas dela estar numa perspectiva humanista. Acho triste porque a gente já teve várias oportunidades de estar num caminho melhor, mas a cena política deturpou isso".

O que você achou desse conteúdo?