A dedicatória do álbum "Traficando Poesias", do grupo GhettoRoots, oferta o disco de estreia do conjunto surgido há mais de 10 anos na comunidade do Dendê, em Fortaleza, "a todas as periferias do Brasil". Unindo as vivências dos quatro integrantes - Roni Flow, Gabriela Savir, Carolina Rebouças e Rodrigo Revolução - e referências do rap, do reggae e de outros gêneros musicais, o trabalho celebra a potência da produção artística e cultural das realidades periféricas.
A trajetória do grupo, como um todo, espelha essa efervescência. "Nós viemos dos saraus das praças, das rodas de artistas nas comunidades... Todo esse percurso é vivo e efervescente nas favelas que transpiram cultura", ressalta Gabriela. Entre processos de mudanças ao longo dos anos - antes no esquema soundsystem, com os quatro vocalistas e um DJ, o grupo passou a ser acompanhado por uma banda, por exemplo -, o GhettoRoots foi se desenvolvendo e, em 2017, construiu um espetáculo sonoro e visual que levava o nome que hoje batiza o disco de estreia.
"A ideia inicial era conseguir misturar as artes cênicas com a cultura de rua, com o objetivo de impactar o público trazendo nossa realidade para os palcos", contextualiza Rodrigo, que avança: "Todos esses processos foram extremamente importantes para o crescimento e desenvolvimento do grupo". O projeto do show rapidamente tomou a forma de um disco quando, em 2018, o grupo foi aprovado no Edital das Artes da Secretaria da Cultura de Fortaleza. A partir da chamada, o disco foi gravado e finalizado.
"Ao longo dos anos trabalhando em prol da produção do disco, muita coisa aconteceu. Muitos parceiros se aglutinaram", afirma Gabriela. Além da banda que acompanha o grupo - formada por Fernando Lélis (sax, flauta, teclado e sintetizadores), Jefferson Braun (bateria), Toti Lima (baixo) e Raul Porfírio (guitarra) -, somaram-se em participações especiais o sanfoneiro e tecladista paraibano Helinho Medeiros; Airton Montezuma e Edson Sancho, responsáveis pela gravação do álbum; o pernambucano Buguinha Dub, que assina mixagem, masterização e finalização; Fábio Villar nos teclados; Tchelmy Sousa na percussão; Pipoca na cuíca e Renan Ramos no trompete. A equipe envolvida é extensa, contando ainda com Bárbara Cipriano na produção e Aparecida Silvino na preparação vocal. A lista poderia seguir.
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"Contamos com músicos maravilhosos que logo de cara se entregaram e sonharam junto com a gente", celebra Rodrigo. Pelas parcerias e somas que moldaram "Traficando Rimas", o álbum expandiu-se para além das influências já fortes de rap e reggae do grupo. "Pudemos brincar com a musicalidade de cada faixa, mexer com tons, elementos e pessoas que fizeram desse disco uma verdadeira obra de arte", define Carolina.
"Nossa referência musical sempre foi o hip hop pelo contexto social em que estávamos inseridos e o reggae chegou também pelo mesmo propósito, por estar bem presente dentro da realidade das quebradas de Fortaleza. No decorrer do percurso, fomos agregando riquezas às novas composições com a chegada de músicos mais ecléticos, que vinham de outros gêneros", explica Roni Flow. "Creio que no meio do laboratório que foi a criação do disco absorvemos muito das vivências desses artistas, o que influenciou, e muito, essa mistura", avalia.
O lançamento do disco de estreia ocorrer em um contexto em que o grupo soma mais de 10 anos de carreira é fruto da trajetória específica, mas revela estruturas e desafios comuns a agentes criadores de diferentes periferias pelo País. "Vivemos num cenário construído para o jovem sem oportunidades continuar sem oportunidades. 'Desfrutamos' das principais mazelas sociais: racismo, desigualdade, educação precária, saúde sucateada e todos os estigmas que o pobre e preto sofre simplesmente por ser o que é", elenca Rodrigo.
É justamente pela potência transformadora da arte, porém, que o disco é celebrado pelo grupo não somente pelo que representa para as pessoas envolvidas em sua produção, mas para outras pessoas e artistas de periferia, pretas e pretos, que podem se identificar com a arte feita pelo conjunto.
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"A cultura é e sempre vai ser a principal ferramenta de transformação social! Sou fruto disso!", ressalta Rodrigo. "A arte alcança onde movimento algum alcança, traz perspectiva de vida num local cheio de negação de direitos. A garra por lutar e a esperança por dias melhores fazem com que possamos ver poesia em meio ao caos. Que a arte possa invadir cada beco e viela desse nosso Brasilzão", deseja Carolina.
Show de lançamento do disco "Traficando Poesias"
Para seguir a banda: @ghettoroots_oficial e www.facebook.com/GhettoRootsProd/
Para ouvir o disco clique aqui