Segundo o dicionário, “drama” significa "qualquer texto ou peça teatral; peça teatral em que se mesclam cenas cômicas e trágicas; episódio muito comovente ou patético; catástrofe". Dos palcos para a vida real, os dramas fazem parte da vida, do crescimento e, em certa medida, são inevitáveis. Borrando a linha que divide o real do fantasioso, é certo que estamos sempre dramatizando, atuando como personagens da vida real que vão mudando de acordo com as necessidades.
Em “Drama”, disco que Rodrigo Amarante lançou em julho de 2021, o real e o imaginário se misturam numa obra ora trágica, ora feliz, ora fantasia, ora amor, ora solidão. Segundo trabalho do carioca de 46 anos, esse é o mote do show que ele traz nesta sexta-feira, 23, ao Theatro José de Alencar. O show encerra a turnê por sete cidades brasileiras antes do retorno para Nova York, onde mora.
Por aqui, ele faz um passeio por vários projetos musicais que participou ao longo da carreira. “Gosto de preservar os repertórios de cada fase. Mas canto pelo menos uma coisa de cada trabalho. Depende muito de cada show”, adianta Amarante, por telefone, sem querer adiantar muita expectativa. Ele conta que o disco novo foi feito “ignorando o ao vivo”. Só depois de feito, ele pensou em como apresentaria o repertório para o público. “Não ia ter como chamar todo mundo do disco. Nesse caso, estou vindo com uma banda brasileira”, acrescenta ele que estará ao lado de Alberto Continentino (baixo), Pedro Sá (guitarra), Nana Carneiro da Cunha (violoncelo e teclados), Daniel Castanheira (percussão) e Rodrigo Barba (bateria).
“Drama” chegou oito anos depois de “Cavalo”, primeiro disco solo após 10 anos na banda Los Hermanos. Se o primeiro era marcado pela solidão, pelos vazios e pela melancolia, o segundo chega mais sorridente, embora nada festivo. A ideia original era que o disco fosse gravado com todos os músicos tocando ao vivo no estúdio. Alguns ensaios e gravações até começaram, mas a pandemia chegou proibindo aglomerações.
Entre boleros, baladas, influências psicodélicas, arranjos de cordas, o álbum acabou sendo gravado – em sua maior parte – em casa, sozinho, com uma série de colaborações à distância. Com passagens instrumentais e arranjos que sugerem ambientes, épocas e lembranças passadas, “Drama” remete a memórias variadas de Amarante, como quando seu pai raspou sua cabeça num ritual de passagem para uma vida mais dura que viria pela frente. “Eu queria criar um universo, uma paisagem de ficção”, explica ele comentando sobre uma busca por uma expressão genuína, uma criação de identidade que passa por aceitar os muitos personagens que interpretamos ao longo da vida. “O método aqui é vestir essas máscaras. Adotar a ficção como essas vozes dentro de mim. Continuo sendo quem eu sou, mas dentro desse teatro”.
Mesmo com essa ideia, ele conta que as composições não nasceram a partir de um conceito, mas o contrário. “O conceito existe, mas não é uma coisa que está por trás. O conceito vem fruto da escrita. A mim interessa amarrar as ideias, descobrir o que estou fazendo. Até em termos de arranjos, uma música vai influenciando a outra. Uma vai dando ideia para outra. Nada disso é preciso, mas eu prefiro fazer um disco no lugar de um saco de canções”.
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A estrada de Amarante
- Los Hermanos – Amarante estreou na música a convite de Marcelo Camelo. Embora fossem os compositores, a banda só gravou três parcerias deles. O baterista Rodrigo Barba foi seu parceiro de banda.
- Orquestra Imperial – Reunindo sambas clássicos e novas composições, a banda de baile carioca foi o primeiro trabalho de Amarante pós-Hermanos.
- Little Joy – Em 2007, Amarante fixou residência em Los Angeles, onde montou o Little Joy, com Fabrizio Moretti (baterista dos Strokes) e Binki Shapiro. O trio gravou um disco.
- Devendra Benhart – O compositor norte-americano é um dos apaixonados pela música brasileira. Amarante colaborou em quatro discos e muitas turnês do texano.
- Cavalo – Feito num “inesperado porém muito bem-vindo exílio numa terra onde não me imaginava achar”, o primeiro álbum solo de Amarante veio após sete anos morando nos EUA.
- Norah Jones – Amarante conta que o Little Joy lhe abriu para novos parceiros. Na lista, ele inclui o projeto 3 na Massa (“Tatuí”), Norah Jones (“Falling”) e Marisa Monte (“O que se quer”), entre outros.
- Lanny Gordin – A primeira composição de Amarante pós-Hermanos foi “Evaporar”, registrada no disco do guitarrista Lanny Gordin. Ele conta que, na véspera da gravação, a música não existia. “Uma honra dessas e eu não tenho uma música nova”, lembra ele que abriu mão de qualquer formalidade estilística e compôs em uma madrugada.
O olhar de fora
Amarante estava no México, dirigindo um roteiro de série "Narcos", para a Netflix, quando começou a pandemia. "Perdi o emprego dos sonhos", lamenta ela que aproveitou o tempo para escrever e gravar o que precisava de "Drama". Mas não sem atentar para o que acontecia no mundo. "Fiquei muito surpreso com muita gente de lá (EUA), que se diz de esquerda, dizer que não acredita em ciência". Votando no exterior, ele fica atento ao que é dito na imprensa brasileira e critica a forma como as mídias sociais são usadas para desinformação.
"Não é exclusividade do Brasil essa coisa da ultradireita. A turma que articulou o golpe, que tirou a Dilma do governo e o Lula da possibilidade de ser reeleito, nisso o Brasil está dando um espetáculo de horror. O Rio de Janeiro talvez seja o pior, que é de onde vem o Bolsonaro e essa corja de miliciano. Estamos muito próximos das eleições e a impressão que dá é que a gente vai mudar isso. Mas coisas não vão mudar de uma hora para a outra. A esperança é que, com a mudança do governo, a gente tenha uma mudança", aspira.
Show Rodrigo Amarante
Quando: sexta-feira, 23, às 20 horas
Onde: Theatro José de Alencar (Rua Liberato Barroso, 525 - Centro)
Quanto: R$180 (inteira), R$90 (meia) e R$100 (solidário). À venda do Sympla e na bilheteria do TJA
Mais informações: www.rodrigo-amarante.com
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