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Que a dor do outro siga nos mobilizando
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Jornalista, professora e consultora. Mestre em Políticas Públicas, especialista em Responsabilidade Social e Psicologia Positiva. Foi diretora de Redação do O POVO, coordenadora do Unicef, secretária adjunta da Cultura e assesora Institucional do Cuca. É autora do livro De esfulepante a felicitante, uma questão de gentileza

Que a dor do outro siga nos mobilizando

Tragédia do Rio Grande do Sul mostra pessoas que se aproveitam da situação e outras tantas – ainda bem que a maioria – que relevam empatia
Tipo Crônica
Governo federal monta sala de situação para acompanhar enchentes no RS (Foto: © REUTERS/Diego Vara)
Foto: © REUTERS/Diego Vara Governo federal monta sala de situação para acompanhar enchentes no RS

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Difícil reconhecer tudo de que somos feitos. Amor e ódio, solidariedade e oportunismo, acolhimento e desrespeito, empatia e falta de senso. Tudo junto na mesma humanidade que compartilhamos. Traços positivos e negativos que se tornam mais presentes em situações limites como a que o país vive no Rio Grande do Sul, de tragédia humana e socioambiental. A dor presencial é no Estado, mas como em um corpo, a dor de um órgão tem consequência nos outros.

Deveria ser assim, mas infelizmente não é. Pessoas morreram - até a última terça eram 83 mortos e 111 desaparecidos -, milhares de outras tiveram suas casas, escolas e comércios invadidos pelas águas, cidades passam por desabastecimento de serviços básicos, começa a faltar comida nos supermercados e inúmeros animais perderam a vida. Já bastava isso para que todos se unissem em uma mesma causa: cuidar, ajudar, minimizar danos, colaborar.

Infelizmente não têm sido poucos os casos de aproveitamento ideológico, político, religioso e tantos outros, principalmente nas redes sociais. Em um deles, o perfil no Instagram @michelediasabreu, que se classifica como “cristã”, “mãe”, “esposa”, “empreendedora”, diz que “Deus está descendo com sua ira total”.

A dona do perfil justifica que esta ira está relacionada ao fato de que o estado do Rio Grande do Sul é um dos que têm o maior número de terreiros de macumba, mais que a Bahia. E que profetas teriam anunciado, no início deste ano, que iria acontecer tragédia lá. Discurso de ódio, fundamentalismo religioso. Isso pode matar alguém.

Até o show da Madonna entrou na rota dos mal intencionados. O show foi vinculado, de forma venal, à tragédia no Rio Grande do Sul. Internautas comentaram, levianamente, que o financiador do evento seria o governo federal. Objetivo: fazer com que leitores pensassem que, ao invés de destinar recursos às vítimas do estado gaúcho, o governo estaria patrocinando shows musicais. Mentira. Manipulação. Estratégia para usar o sofrimento alheio em interesses mesquinhos.

Na política, ao invés de juntar esforços e colocar o ser humano em primeiro lugar, o PSDB, partido do governador do RS, Eduardo Leite, divulgou nota criticando atuação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, no amparo à população gaúcha. Disse que o Governo Federal chegou com atraso. Pesquisei, mas não encontrei, se houve nota do PSDB, no mesmo tom, na época do presidente anterior, que estava passeando de jet-ski durante a enchente da Bahia, no final de 2021.

Ainda bem que não somos só essa parte podre da humanidade. Milhares de iniciativas em todo o País, das mais variadas áreas, mostraram uma população majoritariamente solidária. De empresários a artistas, de vizinhos de apartamentos a autoras, de estudantes universitários a associações comunitárias. Uns enviando dinheiro, outros mobilizando seguidores, uns disponibilizando seu próprio trabalho. Gente que quer ajudar o semelhante, o desconhecido.

Que maravilhança saber que se colocar no lugar do outro continua correndo no sangue da maioria. Que lágrimas não se aguentam quando as imagens da tragédia – com pessoas e animais - nos chegam. Que o ser humano que somos não se deixa contaminar pelos que perderam sua própria humanidade.

Ajudemos o Rio Grande do Sul.

Foto do Ana Márcia Diógenes

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