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O que podemos aprender com o caso Silvio Almeida?
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Cientista política, professora e pesquisadora. Doutoranda em Ciência Política na Universidade de Brasília, mestra em Ciência Política pela Universidade Federal do Piauí, pesquisa políticas públicas. Faz parte da Red de Politólogas e da Rede Brasileira de Mulheres Cientistas. Escreve sobre política, literatura e psicanálise

O que podemos aprender com o caso Silvio Almeida?

O caso envolvendo Silvio Almeida, para além da tristeza que alguns sentem, pode abrir espaço para um debate honesto e qualificado sobre como os feminismos não podem prescindir da dimensão racial e o antirracismo não pode desviar da perspectiva de gênero
Tipo Opinião
Ananda Marques, mestra em Ciência Política (UFPI) (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Ananda Marques, mestra em Ciência Política (UFPI)

As denúncias de assédio sexual que levaram à demissão do então Ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida, tomaram as páginas dos jornais e comentários das redes sociais nos últimos dias. Dentre as possíveis vítimas está a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. Muito rapidamente aconteceu o esperado numa sociedade patriarcal, questionamentos sobre a veracidade das denúncias e desqualificação das vítimas, ainda que a mais conhecida delas, estivesse em silêncio. Em resposta, demonstração de apoio à chefe do MIR, incluindo outras ministras e até a primeira-dama.

Entretanto, algo me chamou atenção ao ler matérias, colunas de opinião e observar o comportamento das redes sociais, a escolha que muitos fizeram entre o viés de raça e o viés de gênero. Como a colega Beatriz Accioly, antropóloga especialista em violência de gênero, relembrou, um caso semelhante aconteceu nos Estados Unidos e pode nos servir de alerta para a falsa oposição entre feminismo e antirracismo.

Em 1991 Clarence Thomas, um homem negro, foi indicado à Suprema Corte norte-americana, e a denúncia de assédio sexual feita por Anita Hill, uma mulher negra, vazou para a imprensa. Assim como no Brasil, a candidatura passa por sabatina no Senado e Hill foi chamada perante a Comissão de Justiça para testemunhar publicamente.

O depoimento se tornou um paradigma da violência de gênero institucionalizada, pois ela foi submetida a perguntas vexatórias, sofreu uma campanha de destruição da sua imagem e foi publicamente atacada e descredibilizada. Já Clarence Thomas teve sua indicação confirmada. Os efeitos do episódio reverberam, principalmente em decorrência das disputas pela opinião pública e pela produção analítica posterior sobre como o caso evidenciava a complexidade do entrelaçamento entre gênero e raça.

O caso brasileiro, para além da tristeza que alguns sentem, pode abrir espaço para um debate honesto e qualificado sobre como os feminismos não podem prescindir da dimensão racial e o antirracismo não pode desviar da perspectiva de gênero. O que podemos aprender é o que Kimberlé Crenshaw e Lélia González já anunciaram, o lugar das mulheres negras numa cultura diz sobre todos os outros lugares. E é a partir de um olhar interseccional que podemos avançar para a dignidade de todas as pessoas.

 

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