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"Eu te amo": um adeus mortal a uma Elza Soares que nunca morrerá
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Jornalista formado na Universidade Federal do Ceará (UFC). Foi repórter do Vida&Arte, redator de Primeira Página e, desde 2018, é editor de Esportes. Trabalhou na cobertura das copas do Mundo (2014) e das Confederações (2013), e organizou a de 2018. Atualmente, é editor-chefe de Cidades do O POVO. Assinou coluna sobre cultura pop no Buchicho, sobre cinema no Vida&Arte e, atualmente, assumiu espaço sobre diversidade sexual e, agora, escreve sobre a inserção de minorias (com enfoque na população LGBTQ+) no meio esportivo no Esportes O POVO. Twitter: @andrebloc

André Bloc esportes

"Eu te amo": um adeus mortal a uma Elza Soares que nunca morrerá

Jornalista relembra entrevista com Elza Soares e a frase que ela repetia a todos, como uma verdade que transborda de um coração enorme
A cantora brasileira Elza Soares assiste ao desfile da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel durante a última noite do desfile de carnaval do Rio no Sambódromo Marquês de Sapucaí, no Rio de Janeiro, Brasil, nas primeiras horas de 25 de fevereiro de 2020. - A cantora foi a homenageada deste ano da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel. (Foto de MAURO PIMENTEL / AFP) (Foto: MAURO PIMENTEL / AFP)
Foto: MAURO PIMENTEL / AFP A cantora brasileira Elza Soares assiste ao desfile da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel durante a última noite do desfile de carnaval do Rio no Sambódromo Marquês de Sapucaí, no Rio de Janeiro, Brasil, nas primeiras horas de 25 de fevereiro de 2020. - A cantora foi a homenageada deste ano da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel. (Foto de MAURO PIMENTEL / AFP)

"Eu te amo". Foi assim que, por décadas, Elza Soares encerrou entrevistas presenciais ou por telefone. Naquela voz inconfundível, daquela cabeça invejável, as palavras saíam fáceis. O interlocutor podia ser alguém íntimo, da cobertura noticiosa musical, ou um anônimo que se voluntariou a fazer uma pauta porque parecia uma experiência única.

"Eu te amo", me disse Elza Soares, e ninguém nunca vai me tirar isso. Ela repetiu as palavras, com maior peso ou menor peso, para alguns milhares. Ninguém sabia cadenciar esse peso como uma mulher negra, carioca, periférica e perseguida pela sanha puritana de uma sociedade metida a branca. Sobreviveu a fome, a relacionamentos abusivos, a perdas irreparáveis e a um ostracismo injustificável.

O "Eu te amo" que ela me dedicou foi num contexto de retomada. Era ali por 2015, quando a musa foi coroada "Mulher do fim do mundo". Década antes, já me lembro de minha mãe falar sobre show de Elza, que calada parecia uma idosa, mas que abria a boca e engolia o mundo inteiro.

Aquele "Eu te amo" não foi manchete de página. Optei por outra frase dela, que entoava mais o ritmo da entrevista. "É pra fuder mesmo", ouvi ela dizer com um sotaque que me deixou tanto quanto mais carioca. Para botar um palavrão num título do Vida&Arte em 2015, foi pedida autorização à presidência do jornal, então quase nonagenário. O dizer da então quase nonagenária foi acatado e a capa imortalizada.

O "eu te amo" daquele dia deve ter sido um dos únicos sem resposta de Elza Soares. Não que eu não amasse, não que ela esperasse algo em troca. Era uma agradecimento de quem voltou de um ostracismo que sequer mereceu — se é que alguém já o mereceu. Eu estava ali para ouvir, era meu papel. Fiquei estático, embasbacado. Ao calar, penso nisso até hoje. Em especial hoje.

Foram muitos os "eu te amo" de Elza Soares. Os mais famosos, mais lembrados, mais celebrados, foram ao grande amor Garrincha, que partiu 39 anos antes, também num 20 de janeiro.

Foram muitos "eu te amo". Mas aquele é só meu.

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