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Cuca vale o desgaste para o Corinthians?
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Jornalista formado na Universidade Federal do Ceará (UFC). Foi repórter do Vida&Arte, redator de Primeira Página e, desde 2018, é editor de Esportes. Trabalhou na cobertura das copas do Mundo (2014) e das Confederações (2013), e organizou a de 2018. Atualmente, é editor-chefe de Cidades do O POVO. Assinou coluna sobre cultura pop no Buchicho, sobre cinema no Vida&Arte e, atualmente, assumiu espaço sobre diversidade sexual e, agora, escreve sobre a inserção de minorias (com enfoque na população LGBTQ+) no meio esportivo no Esportes O POVO. Twitter: @andrebloc

André Bloc esportes

Cuca vale o desgaste para o Corinthians?

Cuca tem direito a treinar um time. Teria esse direito mesmo se tivesse cumprido pena, admitido culpa. E pode até provar a qualidade. Mas devia entender que é natural que ele carregue a bagagem das acusação de crime hediondo
Tipo Opinião
Técnico Cuca no jogo Goiás x Corinthians pelo Campeonato Brasileiro Série A 2023 (Foto: Rodrigo Coca/Agência Corinthians)
Foto: Rodrigo Coca/Agência Corinthians Técnico Cuca no jogo Goiás x Corinthians pelo Campeonato Brasileiro Série A 2023

É impossível condenar ou absolver alguém acusado de um crime ocorrido há 35 anos sem acesso à investigação criminal do caso. Perante a lei (suíça), porém, Cuca foi considerado culpado por atentado ao pudor e coação a uma menina de 13 anos, no episódio conhecido como Escândalo de Berna.

Isso não significa que ele é culpado. Julgamentos erram. Significa ainda menos que ele é inocente. De certa forma, Cuca é como um gato de Schrodinger da natureza humana, culpado e inocente até que se prove o contrário — o que é impossível de acontecer hoje.

Agora, não basta a convicção sobre um crime para condenar alguém. É preferível errar ao absolver um culpado do que ao condenar um inocente. Mas me reservo o direito de colecionar pulgas atrás da orelha.

Cuca é vítima do próprio sucesso. É o único dos quatro acusados que permaneceu relevante. O zagueiro Henrique teve a melhor carreira em campo, sendo por anos titular do (mesmo?) Corinthians que o ex-meia hoje treina. O goleiro Eduardo teve trajetória decente, chegando até a ser ídolo do Ceará na década de 1990 com o vice da Copa do Brasil — para quem não sabe, ele era conhecido como Chico. O ponta Fernando, sobre quem pesava apenas a menor das acusações, teve carreira mais discreta.

Eles pouco tiveram o que responder à época, diante do ufanismo do jornalismo esportivo brasileiro de então, que os tratou quase como heróis regressos de batalha judicial injusta. Depois da década de 2020, Cuca passou a ser cobrado. E ainda que ele diga que foi perguntado pela primeira vez sobre o assunto em coletivas, ele se negava a falar no assunto até 2021.

A pulga que me causa mais coceira atrás da orelha é a que morde sobre o discurso de injustiçado 35 anos depois. Do quanto Cuca sublinha que "faz questão" de falar de um assunto que jogava para debaixo do tapete. Da necessidade de ele sempre falar da esposa e das filhas — no que soa como aquele cara acusado de racismo e que diz que tem amigos negros. Do quanto a história que ele contou em 2021, em 5 minutos de vídeo, e a de hoje têm inconsistências entre si. E nem entro nos relatos de três décadas atrás, que não batem com os discursos de hoje.

Houve um avanço. Se na época era oba-oba para os acusados, hoje um time inteiro se posiciona contra a contratação de um dos ex-atletas. O Corinthians atual tricampeão brasileiro e dono de duas Libertadores. O time feminino do Timão.

Cuca tem direito a treinar um time. Teria esse direito mesmo se tivesse cumprido pena, admitido culpa. E pode até provar a qualidade. Mas devia entender que é natural que ele carregue a bagagem das acusação de crime hediondo. Que é natural ser cobrado com maior rigor, ainda mais dentro de um clube que se orgulha dos preceitos democráticos — que incluem o respeito às minorias.

Fato é que Cuca talvez seja, de fato, inocente. E perdeu a chance de provar isso nos anos 1980.

Nota: a coluna foi escrita na segunda-feira, 24. Na terça, 25, o advogado da vítima afirmou ao UOL que ela reconhece Cuca como um dos estupradores

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