Ariadne Araújo é jornalista. Começou a carreira em rádio e televisão e foi repórter especial no O POVO. Vencedora de vários prêmios Esso, é autora do livro Bárbara de Alencar, da Fundação Demócrito Rocha, e coautora do Soldados da Borracha, os Heróis Esquecidos (Ed. Escrituras). Para além da forte conexão com o Ceará de nascença, ela traz na bagagem também a experiência de vida em dois países de adoção, a Bélgica, onde pós-graduou-se e morou 8 anos, e Portugal, onde atualmente estuda e reside.
Aprender poesia, música e literatura durante o curso de medicina. Em Portugal, mas também no Brasil, a ideia vai, aos poucos, encontrando o seu caminho
Foto: Bertrand Livreiros
Professor João Luís Barreto
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Na faculdade de medicina do Porto, o professor João Luís Barreto entra em sala de aula não com compêndios medicais. Mas com as mãos cheias de livros de poesia. Aos futuros médicos do segundo ano, ele ensina que, como um poema, cada doente é único. A ideia é que, ao aprenderem mais sobre os jogos de enigmas lançados pelos poetas, eles aprendam a decodificar o que está oculto no que é dito ou nos não-ditos pelos pacientes. Isso é fundamental para um contato menos técnico e distante. Com seus poemas, ele quer levar mais empatia e humanidades aos consultórios médicos.
João Luís Barreto sabe disso por experiência própria. Nascido no Porto, construiu a carreira como doutor em cirurgia reconstrutiva em paralelo com a de poeta. Hoje tem mais de 12 livros publicados e traduzidos em muitos idiomas. Essa dupla face consagrou-o, dentro e fora de Portugal e tem sido procurado por outras universidades para ministrar suas aulas de poesia. A partir das aulas de posia, a Faculdade de Medicina do Porto deu mais um passo e introduziu também a disciplina de música, com uma violoncelista. As aulas têm tido sucesso entre os estudantes.
As poesias que ele disseca em aula têm temas ligados à saúde, ao nascimento, ao cansaço profissional, à morte, ao luto, à dor, às doenças, ao corpo, ao medo. Escolhidas à dedo, são desenroladas pela turma, como um fio que João Barreto joga para quebrar o tecnicismo das aulas e do aprendizado medical. Nas suas entrevistas à imprensa, ele diz ver a poesia como uma “máquina verbal”, que trabalha e burila a palavra e a forma, do mesmo jeito que faz um médico, seja no trabalho da estética ou da saúde do paciente.
No Brasil, é a medicina narrativa que vai fazendo caminho. Na Faculdade de Medicina, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), as oficinas de escrita criativa para futuros médicos inspiram-se nos trabalhos da médica Rita Charon, da Universidade de Columbia, em Nova Iorque (EUA). Segundo Charon, examinar os elementos de narrativa literária prepara os estudantes para as leituras que farão na vida profissional - as “caóticas” narrativas médicas. Ou seja, o mundo dos prontuários, diagnósticos, exames físicos e, principalmente, as histórias narradas pelos pacientes.
Achei estas aulas uma grande novidade, embora elas já aconteçam há algum tempo. Fazem-me lembrar uma frase lida numa entrevista com o escritor português José Saramago: “é pela palavra que nos fazemos, que nos criamos, que nos salvamos”. Com estes poemas, contos, crônicas, prepara-se uma nova geração de médicos. Na crônica da próxima semana, vamos saber como isso acontece na UERJ e como, o que começou timidamente, está fazendo escola nas faculdades de medicina.
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