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Menos bebês e mais robôs
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Ariadne Araújo é jornalista. Começou a carreira em rádio e televisão e foi repórter especial no O POVO. Vencedora de vários prêmios Esso, é autora do livro Bárbara de Alencar, da Fundação Demócrito Rocha, e coautora do Soldados da Borracha, os Heróis Esquecidos (Ed. Escrituras). Para além da forte conexão com o Ceará de nascença, ela traz na bagagem também a experiência de vida em dois países de adoção, a Bélgica, onde pós-graduou-se e morou 8 anos, e Portugal, onde atualmente estuda e reside.

Menos bebês e mais robôs

Após o Covid-19, os países asiáticos abriram as portas para os robôs. No Japão e na Coreia do Sul, estes pequenos seres de lata e plástico são onipresentes nas lojas, nos bares, nos cafés, nas salas de reuniões, nas indústrias. Também nos serviços públicos
Tipo Crônica
Androide Arthur, no filme Passageiros (Foto: Reprodução)
Foto: Reprodução Androide Arthur, no filme Passageiros

Na Coreia do Sul não se brinca com o assunto. A polícia investiga a sério a queda mortal de um robô funcionário público, encontrado aos pedaços, junto à escada do Conselho Municipal de Gumi. Os jornais e as redes sociais especulam: burnout ou suicídio? Querido entre os colegas da prefeitura, o engenho subia e descia elevadores, deslizando sobre rodas, levando no corpo cilíndrico a correspondência do dia e documentos a assinar. Para os engenheiros, a autópsia vai comprovar um mal-funcionamento técnico. 

Menos bebês e mais robôs. A Coreia do Sul tem a taxa de natalidade mais baixa do mundo. Quase uma crise demográfica. Entre as causas, uma decisão das mulheres, por conta do funcionamento no mundo do trabalho. Tirar licença maternidade de dois anos e não ter mais trabalho na volta. Ou perder o bonde das promoções e ficar por último no plano de carreira. Num país muito competitivo, também o preço da educação dos filhos passou a ser um problema. 

Para evitar a exclusão e o risco de fracasso na vida adulta, desde muito cedo as crianças têm aulas extracurriculares caríssimas: entre elas, matemática, música, inglês e até taekwondo. Sem estas aulas, a ideia é de que os filhos ficarão para trás. Apenas 2% deles desistem deste esforço financeiro, mas por falta de condição. Neste cenário, a decisão de ter ou não ter filhos exige cálculos financeiros para os pais e a certeza de um esforço nos estudos, por décadas, para a criança.

Na falta de braços novos para as vagas no setor do trabalho, vamos aos robôs. Cabo é um robot barmen, em Seoul. Serve bebidas e talha o gelo para embelezar os drinques do Coffee Bar K. Já o braço mecânico do drink Bot é especialista em coquetéis, que ele prepara como ninguém. Segundo a Federação Internacional de Robótica, a Coreia do Sul tem a maior densidade de robôs no mundo. Nas indústrias, a cada 10 mil empregados, 1 mil são robôs. Na França, a média cai bruscamente: a cada 10 mil empregados, 180 robôs.

A prefeitura de Gumi aguarda o fim das investigações para decidir se vai substituir o seu funcionário robô por outro, mais performático. É bem possível que sim, numa sociedade onde se encoraja a automação plena dos serviços feitos por humanos. Na Coreia do Sul, já se experimentam os robôs nas prisões. Fico pensando como será este mundo, cada vez mais automatizado. Tomar um coquetel servido por uma mão metálica, com a qual não se pode conversar, até pode ser.

Mas, perde-se aquele momento único de confidências com um barman de carne e osso - terapeuta casual dos erráticos noturnos. A não ser que seja o androide Arthur, que comanda o bar, no filme Passageiros. Ele, todo charme e rapidez, nas suas pernas rolantes. Por enquanto, só possível no espaço sideral do cinema. Aqui na Terra, eles se suicidam. E com eles, morremos de tédio.

 

 

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