Ariadne Araújo é jornalista. Começou a carreira em rádio e televisão e foi repórter especial no O POVO. Vencedora de vários prêmios Esso, é autora do livro Bárbara de Alencar, da Fundação Demócrito Rocha, e coautora do Soldados da Borracha, os Heróis Esquecidos (Ed. Escrituras). Para além da forte conexão com o Ceará de nascença, ela traz na bagagem também a experiência de vida em dois países de adoção, a Bélgica, onde pós-graduou-se e morou 8 anos, e Portugal, onde atualmente estuda e reside.
Fim dos dias de beleza, com os jogos paraolímpicos. Sofri com eles, sorri com eles, torci por eles. Inquebráveis, dizem os franceses. Inoxidáveis, diria o povo cearense. De puro aço: músculos e vontade
Pela televisão francesa, acompanhei a história de alguns Inquebráveis – título de um programa, durante os Jogos Paraolímpicos 2024. Atletas excepcionais em corpos amputados, membros paralisados, olhos cegos, doenças congênitas. Nenhuma destas diferenças se interpôs entre eles e o esporte de alto nível. Entre eles e as medalhas. Com disciplina e força de espírito, superam-se. Superam-nos.
A indiana Sheetal Devi nasceu sem braços, por conta de uma anomalia congênita rara, a focomelia. Com apenas 17 anos de idade, esta adolescente foi à luta. Desenvolveu um método só dela para praticar o exporte de sua preferência: o tiro ao arco. Sentada no chão, usa os pés, o ombro e a mandíbula para segurar o arco, tencionar a corda e lançar a flecha. Medalha.
O francês Benjamin Pillerault, 38 anos, nasceu com os dois pés tortos - boto equinovaro – o que rendeu cirurgias e anos de tratamentos. Um dia, os pés incharam e os médicos propuseram a amputação. Aceitou na hora. Melhor sem eles que viver na dor e no risco. Joga vôlei sentado no chão e ganha medalhas assim. “Faço tudo o que eu quero fazer. Mas, depois de um jogo de vôlei sentado, tenho de pôr gelo na bunda”, diz, morrendo de rir. Medalha.
Aos 22 anos, o brasileiro Gabriel Araújo conquistou o mundo. Quem não torceria pela graça de Gabrielzinho, como ficou conhecido nas redes sociais? Como a adolescente indiana, nasceu com focomelia - afetou o desenvolvimento dos membros superiores e inferiores. Na piscina, desenvolveu a “golfinhada”, um movimento ondulatório que só ele consegue fazer. Medalha.
O esporte fazendo resgate nas vidas das gentes. O “homem foguete” conquistou o público com a técnica, também com a leveza das brincadeiras, danças, caretas, risadas. Gabrielzinho nos diz “só depende de mim”. Pillerault nos lembra de rir de nossas próprias limitações. Mas, os desafios superados no esporte, ainda são intransponíveis para milhares, na vida cotidiana.
“Era uma vida perfeita. Era lindo. Lá fora sabemos que não vai ser a mesma coisa”, disse, sobre os jogos paraolímpicos, a velocista italiana cega e trans, Valentina Petrillo, 51 anos. Alvo de assédios desde 2019, quando concluiu a sua transição, foi acusada de “batoteira” por J.K. Rowling, autora de Harry Potter.
Para estes, que fora ou dentro das pistas olímpicas têm a vida dura, lanço a grande onda silenciosa inclusiva - a que o público em Paris inventou para torcer durante o futebol para cegos. Levantar-se por estes inquebráveis, atletas ou não – já que podemos nos levantar, correr, ver, falar. Por eles, para recuperar nossa humanidade, lutar por mais acessos e inclusão, em todas as áreas.
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