E você, acredita ser viável um automóvel brasileiro?
Boris Feldman é mineiro, formado em Engenharia e Comunicação. Foi engenheiro da fábrica de peças para motores Metal Leve e editor de diversos cadernos de automóveis. Escreve a coluna sobre o setor automotivo no O POVO e em diversos outros jornais pelo país. Também possui quadro sobre veículos na rádio O POVO/CBN
Existem duas grandes empresas nacionais que fabricam automóveis: a HPE do Grupo Souza Ramos, licenciada para produzir modelos da Mitsubishi. A CAOA, que se associou com a chinesa Chery para importar e produzir seus veículos no Brasil. E já tivemos duas importantes fábricas do setor, a Vemag (licença DKW) e a FNM (caminhões e automóveis Alfa Romeo).
Tivesse o governo incentivado realmente a implantação de uma fábrica (como fez com a Embraer) ou como a parceria que a China exigiu das marcas que lá se instalaram, talvez tivéssemos hoje uma poderosa empresa do setor. Competência para isso não nos falta: Rino Malzoni, que criou o Puma, João Gurgel, que produziu milhares de jipes e Mário Araripe com seu Troller são alguns dos empresários que comprovaram este talento.
E que não sobreviveram nem mesmo produzindo modelos de nicho de mercado. Não tivesse se arriscado num carrinho compacto para competir com Gol e Uno, talvez tivéssemos até hoje a Gurgel produzindo seus ótimos jipes. Como existem os pequenos produtores de esportivos, jipes ou bugies. Sempre surgem visionários como Nelson Fernandes que criou na década de 60 a IBAP (Indústria Brasileira de Automóveis Presidente), sapecam ações no mercado e quebram logo depois...
Lecar – Um que sonha produzir um automóvel em grande escala é Flávio Figueiredo Assis, que anunciou o Lecar, um elétrico projetado por uma equipe de engenheiros brasileiros que seria produzido no Rio Grande do Sul. A onda do carro à bateria acalentou seu sonho, pois construí-lo é muito mais simples que o tradicional, com motor à combustão.
O elétrico dispensa dezenas de componentes de custo elevado e que tornam complexa a montagem do automóvel. Mesmo assim, Elon Musk foi quase uma exceção entre as diversas fábricas de elétricos que pipocaram nos EUA. Até a poderosa Volkswagen está em apuros com sua linha à bateria e já recorreu a alianças com chineses e norte-americanos para se tornar competitiva no mercado internacional.
Depois de apresentar o protótipo do seu Lecar 459 e “competir” com a BYD na compra das instalações da Ford em Camaçari (BA), Assis percebeu que o buraco é mais em baixo e anunciou uma guinada de 180º em seus planos: o carro não será um elétrico, mas um híbrido. Mercadologicamente correto, mas tornou ainda mais distante seu sonho pela construção bem mais complexa. E não seria rigorosamente um hibrido pois o motor a combustão não traciona o carro, mas aciona um gerador que carrega a bateria. Mesma (boa) solução do sistema e-Power da Nissan. Assis se auto denominou “Elon Musk brasileiro” mas, ao contrário do bilionário que montou a Tesla, diz depender de financiamentos para tocar seu projeto.
Bravo Motors Company – O argentino Miguel Angel Bravo montou sua empresa nos EUA, apresentou vários protótipos de buggies, carros urbanos e veículos alternativos de transporte público, nenhum deles concretizado. Assinou protocolo de intenções com o governo de Minas Gerais em 2021 para estabelecer na Grande BH um mega empreendimento de R$ 25 bilhões para produzir veículos elétricos e baterias. Chegou a anunciar parcerias, entre elas com a ABB e a Rockwell Automation, duas multinacionais do setor. A Rockwell confirma o contato inicial há dois anos e a possibilidade de ceder sua tecnologia para implantar uma moderna linha de montagem, e nada mais até hoje.
A Bravo iria construir sua fábrica, ou melhor, o “Parque Industrial Colossus Cluster” na região da Lagoa dos Ingleses numa área cedida pela prefeitura de Nova Lima. Mas os investidores não apareceram e a obra prevista para ter inicio em 2023 não saiu do papel. A empresa agora diz não ter recebido apoio em Minas, que o governador Zema chegou a declarar que o carro elétrico gera desemprego e decidiu levar seu Colossus para São Sebastião do Passé, na Bahia.
Assinou um novo protocolo de intenções, ganhou terreno de 400 mil m2 e anunciou uma fábrica de baterias de lítio. Um projeto, segundo executivos do setor, que dificilmente fecha as contas pelo volume ainda inexistente de demanda de células de lítio no Brasil e região.
Será que o Brasil perdeu o bonde da história ou ainda temos condições de recuperar o tempo perdido?
Mais Boris? autopapo.com.br
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