Boris Feldman é mineiro, formado em Engenharia e Comunicação. Foi engenheiro da fábrica de peças para motores Metal Leve e editor de diversos cadernos de automóveis. Escreve a coluna sobre o setor automotivo no O POVO e em diversos outros jornais pelo país. Também possui quadro sobre veículos na rádio O POVO/CBN
O brasileiro ficou como o José da poesia que nosso imortal Drummond publicou em 1942: abandonado, só e desamparado quando é vítima de um acidente de trânsito.
Até 2023, os acidentados ainda eram – inadequadamente - cobertos pelo seguro obrigatório, o DPVAT. Um sistema perverso pois o motorista pagava cada vez mais, porém a indenização permanecia imutável durante anos e não cobria suas despesas. E os cofres da seguradora transbordando. Mas pelo menos recebia uns trocados pelo tratamento hospitalar ou auxilio funerário.
Até que a seguradora (Lider) que o administrava foi afastada, tantas foram suas bilionárias maracutaias. Sem que nenhum de seus diretores fosse para o xilindró.
A Caixa Federal, nova encarregada do DPVAT, assumiu sua administração em janeiro de 2021, mas a fonte secou em novembro de 2023. Tinha-se esgotado a “sobra” de R$ 4,5 bilhões que recebera dos cofres da Lider. E o governo se “esqueceu” de estabelecer até o fim de 2023 um novo plano para a volta do DPVAT a partir de 2024.
Idas e vindas do DPVAT
No início do ano passado, o Legislativo acatou a proposição do Executivo e votou a Lei Complementar 207/24 que previa o retorno do seguro a partir de 2025. Trocou o nome para SPVAT e a verba continuaria a ser administrada pela Caixa. Inconstitucionalmente, diga-se de passagem, pois ela não é uma seguradora, mas um banco.
Mas tanto se criticou a medida que ela foi revogada em dezembro de 2024 pelo próprio Congresso que a tinha aprovado em maio. E veio o tiro de misericórdia do próprio presidente Lula ao sancionar o veto, deixando desamparadas as vitimas de acidentes de trânsito.
Coisas do nosso governo: revoga medidas tomadas por ele mesmo, como foi o vexame do PIX poucos dias depois.
O resumo da opera (ou da “poesia”) é que – seja lá como for - as vítimas de acidentes vinham sendo amparadas há 50 anos pelo seguro obrigatório.
Inicialmente pela seguradora contratada livremente pelo dono do carro, como em outros países. Depois, o olho gordo de políticos e banqueiros carreou os bilhões de reais arrecadados anualmente para uma única seguradora, um consórcio de 80 delas, a Lider.
Desmoralizado pelas fraudes, o seguro obrigatório acabou sendo eliminado por um governo tão incompetente, que foi incapaz de estabelecer uma sucessão para a Lider, nem outra qualquer para que o brasileiro (principalmente o mais carente) continuasse assistido se envolvido num acidente de trânsito.
Possível volta do DPVAT
Quem poderá estabelecer um novo seguro para substituir o DPVAT é o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) que ainda não se manifestou oficialmente, mas sua tendência é de propor o retorno do seguro ao regime inicial da livre escolha, ou seja, o dono do veículo contrata a seguradora que melhor lhe aprouver.
As corretoras e companhias de seguro homologadas pelo governo para administrar o DPVAT constituiriam um fundo para indenizar as vitimas dos Veículos Não Identificados (VNI) sem necessariamente a prova da culpa. E também a inclusão do seguro obrigatório no processo anual de licenciamento dos veículos, como era o DPVAT.
É importante que parlamentares sejam sensibilizados para se criar um sistema que não considere o DPVAT um imposto, mas um seguro social que protege pedestres, motoristas e passageiros vítimas de um acidente de trânsito.
A gravidade do problema é o desamparo do acidentado, pois, por enquanto, não tem DPVAT, SPVAT, seguro obrigatório, assistência, proteção e nem a quem recorrer. Esta é a situação atual do brasileiro vítima de um acidente de trânsito: totalmente desassistido e ignorado pelo governo. Como, aliás, termina o próprio Drummond:
Sozinho no escuro qual bicho-do-mato, sem teogonia, sem parede nua para se encostar, sem cavalo preto que fuja a galope, você marcha, José! José, para onde?
Esse conteúdo é de acesso exclusivo aos assinantes do OP+
Filmes, documentários, clube de descontos, reportagens, colunistas, jornal e muito mais
Conteúdo exclusivo para assinantes do OPOVO+. Já é assinante?
Entrar.
Estamos disponibilizando gratuitamente um conteúdo de acesso exclusivo de assinantes. Para mais colunas, vídeos e reportagens especiais como essas assine OPOVO +.