Linguista e semioticista, professora da Universidade Federal do Ceará, com doutorado na Universidade de Liège (Bélgica) e pós-doutorado na Universidade de São Paulo
Linguista e semioticista, professora da Universidade Federal do Ceará, com doutorado na Universidade de Liège (Bélgica) e pós-doutorado na Universidade de São Paulo
Neste 2024 faz 50 anos que Ednardo lançou seu primeiro disco solo "O romance do pavão mysteriozo". Grande hit da década de 1970, tema de novela, a canção que coincide com parte do título do álbum foi, nas palavras do próprio Ednardo, responsável por lançar o Pessoal do Ceará para o centro da "jogada nacional". O resto da história conhecemos bem: as canções de Belchior, a presença de Amelinha, o sucesso de Fagner…
Para além da projeção individual, permanece a questão do que afinal constitui essa identidade "Pessoal do Ceará". Tudo está em questão, desde o que garante sua união até quem são de fato seus integrantes. Para pensar mais um pouco nessa união, é outra canção do Ednardo que vem ao socorro: "Terral". Podia escolher tantas outras, mas "Terral" é hino e, como tal, finca as pessoas no país e justifica o nome: "do Ceará".
Segundo Américo Saraiva, no entanto, a origem só não dá conta de unir esses músicos, que, na década de 1970, migraram para as grandes metrópoles do Sul/Sudeste do país: "um grupo heterogêneo, portanto, com propósitos diversos e concepções variadas de seu ofício". A atitude de resistência cultural, marcada também pelo contexto político que se instaurara no país, aparece como traço que une as diferentes perspectivas, mas também a urbanidade, a contemporaneidade das temáticas, o resgate das tradições culturais…
Porém, antes de mais nada, o impulso de migrar: a saída do Ceará, a chegada em outras praias (às vezes sem praia), o retorno nostálgico e a permanência combativa marcam presença nas canções do Pessoal, e Saraiva conclui que é enfim uma identidade fincada no próprio percurso, no migrar e suas muitas faces.
E é aí que me encontro, fazendo o caminho inverso. Migrar do Sudeste para o Ceará não foi simples: precisei de tempo para entender os modos, a cidade, o clima. O fortalezense às vezes desconfiado não dá moral para a paulista abusada. Precisei então mostrar que queria mesmo fazer desta aqui minha terra. Começaram aí as amizades, as trocas, as confidências e me sinto finalmente em casa.
Se hoje menos presentes na lembrança de alguns cearenses, essa turma - o Pessoal do Ceará -, esse artista - Ednardo -, essa canção - "Terral" - dão um pouco do tom e do ritmo da vida desta desterrada que vos escreve e que pode enfim dizer: "eu sou do Ceará". n
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