
Linguista e semioticista, professora da Universidade Federal do Ceará, com doutorado na Universidade de Liège (Bélgica) e pós-doutorado na Universidade de São Paulo
Linguista e semioticista, professora da Universidade Federal do Ceará, com doutorado na Universidade de Liège (Bélgica) e pós-doutorado na Universidade de São Paulo
Conhecemos o estilo do Studio Ghibli, estúdio de animação japonês criador de filmes como a Viagem de Chihiro, o Castelo animado e Meu amigo Totoro. Se não conhecíamos, agora conhecemos, dada a trend recente nas redes sociais de transfigurar imagens, das mais cotidianas até memes e fotografias famosas, em cartuns no estilo do estúdio de animação com a ajuda da inteligência artificial. As redes foram assim invadidas por montes de cartuns, das cenas mais variadas, que pareciam saídos de filmes de animação.
A comunidade dos artistas visuais reagiu a essa tendência apontando a incoerência entre o uso da inteligência artificial e a filosofia do Studio Ghibli, que preza por uma estética fruto de trabalho artesanal. Outro argumento frequente é que o estilo não está protegido por leis de propriedade intelectual e nada dessa produção retorna para os criadores do estilo original.
O fato é que a IA é um ótimo imitador que gera respostas dinâmicas a partir de um comando associado a uma base de dados imensa. O que quer dizer que ela faz surpreendentemente bem reproduções daquilo que já foi; ela replica de forma inusitada as formas, linhas e cores, ideias e sons, da nossa memória coletiva. Ela está voltada para o passado e não é capaz do futuro, se entendermos o futuro como a criatividade, a possibilidade de fazer uma obra nova, autêntica e original pois imaginada. A capacidade do futuro, do ainda não imaginado, é essencialmente humana.
O que se tem com o uso da IA, enfim, é uma imagem genérica, com ares daquilo que é produzido pelo estúdio japonês, mas que não resiste a uma comparação mais próxima das imagens originais. A impressão que temos é que há uma certa homogeneização das linhas e formas. Perde-se algo nesse processo.
Nos últimos 8 anos, tive o prazer de acompanhar de perto o trabalho de Leonardo Camillo, ator renomado por dublar vozes como as de Richard Gere, Dustin Hoffman e por fazer a voz do Ikki de Fênix em Cavaleiros do Zodíaco. O universo da dublagem está também às voltas com a chegada da IA, que é capaz de reproduzir o timbre de um ator nas diversas línguas. Acontece que dublar não é reproduzir uma voz. Dublar é traduzir uma emoção e imprimir uma identidade, fazer a passagem de uma cultura a outra. A originalidade desse fazer é trabalho da sensibilidade humana. n
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