Logo O POVO+
Tudo ainda é uma despedida
Foto de Chico Araujo
clique para exibir bio do colunista

Chico Araujo é cearense, licenciado em Letras, professor de Língua Portuguesa e de Literatura brasileira

Tudo ainda é uma despedida

Quando enfrentamos um adeus definitivo, quando perdemos definitivamente alguém que nos é muito caro, somos invadidos por onda de tristeza que nos absorve, que toma conta de todo o nosso ser
Tipo Crônica
Vista da Avenida Beira Mar (Foto: José Guedes)
Foto: José Guedes Vista da Avenida Beira Mar

O título acima é oriundo de uma conversa no aplicativo WhatsApp. Na verdade, é um trecho de uma resposta a uma questão proposta sobre como se encontrava uma pessoa em sua data de aniversário, o primeiro sem a presença física da mãe. Tudo ainda é uma despedida se configurou como uma resposta-denúncia de dor calada, uma dor doída em silêncio, uma dor permanente diante da perda da mãe pelo falecimento dela.

Quanto tempo é necessário para podermos aprender a lidar com uma grande perda? O tempo referente à intensidade do amor sentido, me alertou Liliana Lima, terapeuta. Eu, comigo, em meu silêncio conversador, fico sem uma resposta precisa, porém admitindo que o tempo expurgador dessa pena seja exatamente o indispensável para que toda a dor deixe de doer para se acomodar no universo pleno da saudade.

A partida de alguém querido desse plano físico, que conhecemos, para um plano transcendental, sobre o qual temos apenas “impressões calcadas em desejos de ambiente feliz”, inaugura em nós o rompimento da relação existente, instaurando em nosso espírito o advento da dor, sentimento passível de agudização, quando a ferida aberta perturba nosso estado espiritual que desejamos sempre pacificado.

Quando enfrentamos um adeus definitivo, quando perdemos definitivamente alguém que nos é muito caro, somos invadidos por onda de tristeza que nos absorve, que toma conta de todo o nosso ser. A tristeza, sentimento natural, nos amargura, nos desequilibra, nos lança a momentos de caos; contudo, é necessária como etapa de convivência com a dor até que esta se cumpra em sua finalidade precípua e promova a expurgação do mal-estar que causa.

O luto é algo necessário de ser vivido por quem tem a experiência de uma grande perda e, sem precisão, carece de tempo para que o sujeito aprenda a lidar com ela de maneira a elaborá-la, no sentido de transformar a dor dela nascida em apaziguamento do espírito. A tristeza, o assombro, o “desenredo” vivido, a sensação de que nada mais faz sentido a partir do afastamento inevitável da pessoa amada precisa passar por expurgação para que a vida de quem está na experiência da perda volte a fazer sentido.

Enquanto não se alcança a superação da dor pela perda ocorrida, “tudo ainda é uma despedida” que, no cotidiano vivido, será sentida com maior ou menor intensidade, considerando os acontecimentos. Arrumar a casa, mexer nos guardados, rever fotografias, ouvir canções, visitar lugares, lembrar conversas, escrever um texto podem ser formas de se ir preparando o espírito choroso para um novo momento em que ele esteja apto a admitir a perda, aceitando-a como força capaz de revolucionar a própria existência, distanciando-se da melancolia e abraçando-se a um novo “sopro de vida”.

%MCEPASTEBIN%

Foto do Chico Araujo

A soma da Literatura, das histórias cotidianas e a paixão pela escrita. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?